GARCIA, Edília Coelho. Um século de mudanças. Editorial. Educação. Rio de Janeiro, v.32, n.101, abr./jul. 2000. p.4.

EDITORIAL

"Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades.
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades."

Luís Vaz de Camões

A ABE tem passado por mudanças, mantendo sempre, entretanto, o mesmo idealismo dos signatários dos dois célebres manifestos do nosso mundo educacional: "Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova" e "Mais Uma Vez Convocados".

Anísio Teixeira, signatário dos dois documentos, é o exemplo vivo "das mudanças de vontades" que, ao longo do tempo, levaram a ABE a ter "novas qualidades". Não fosse isso, ela estaria morta.

Se a linguagern dos dois Manifestos sofreu "mudanças", elas representaram a escolha de novos caminhos para obtenção do melhor, sempre visando ao engrandecimento da educaçào, permanentemente adaptada a um mundo em constantes mutações e de que foram reflexos, no Brasil, as sucessivas mudanças de nossa legislação, desde 1924.

Uma luta, por exemplo, se travou durante anos, pela equivalência dos cursos de nível médio. A partir da divisão estanque dos "ramos" de escolaridade, ao tempo da Reforma Francisco Campos, quem, terminando um curso técnico, pretendesse realizar um curso superior, deveria voltar a percorrer mais sete anos na escola secundária - "a estrada real para a Universidade ", no dizer do Ministro Gustavo Capanema.

Ao longo do período republicano, sucessivas leis do ensino tentaram ser espelho das mudanças que se verificavam e que refletiam tendências filosóficas em curso na política brasileira. E num século de mudanças, cujo ritmo se acelerou até a vertigem de hoje, por força do desenvolvimento da ciência, da técnica e das comunicações, as leis, porque eram rígidas, envelheceram precocemente, o que as levou a serem periodicamente substituídas.

Se a linguagem dos dois Manifestos sofreu "mudanças", os seus sonhos permaneceram. Foi o caminho a ser trilhado visando, sempre, ao direito à educação, seja na rede pública, seja na rede privada - princípio Constitucional assegurando-se aos pais o direito de escolherern o tipo de educação que desejam para seus filhos (Declaração Universal dos Direitos do Homem).

Estes são os princípios democráticos que Anísio Teixeira nunca deixou de defender, inclusive no seu livro "Educação e Democracia". Jamais faltou à ABE ter novas qualidades, estimulando professores, alunos e escolas a um trabalho sempre renovado.

O "Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova" e o "Mais uma vez Convocados", além de outros, são exemplos marcantes das manifestações do pensamento abeano, consolidado sobretudo nas Conferências Nacionais de Educação, realizadas pela ABE.

As idéias de Anísio Teixeira e de outros grandes educadores da Associação Brasileira de Educação, guardadas carinhosamente em seus arquivos, nestes 76 anos de existência, serão sempre a bandeira que a conclamou a preservar pensamento e ação de seus inspiradores.

Onde a ABE não mudou foi em ser, permanentemente, um Fórum de debates no qual os educadores de hoje estudam as novas leis, os novos objetivos da educação associada à cultura, defendendo, como os que nos antecederam, a filosofia da educação que consagre o princípio da liberdade e da democracia.

Este é o legado que pretendemos transmitir aos nossos pósteros.

No momento em que a Associação Brasileira de Educação se congrega para homenagear ANÍSIO TEIXEIRA, pelo transcurso do centenário de seu nascimento, que se registre, para reflexão, o pensamento desse grande educador brasileiro, trecho do documento que talvez tenha sido o seu último trabalho:

" ... Com efeito, todo o presente modo de pensar do homem é modo de pensar em termos de mudança. A essência do método científico está em sua posição de juízo suspenso. Tudo que fazemos se funda em hipóteses, sujeitas obviamente a mudanças. Tais mudanças decorrern de novos conhecimentos, os novos conhecimentos decorrern de novas experiências e tais novas experiências do fluxo ininterrupto de mudanças que sobrevêm no processo mesmo de ordem da vida, como é hoje concebida no curso da existência humana."

Edília Coelho Garcia
Presidente

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