BOAVENTURA, Edivaldo M. Anísio Teixeira e a autonomia da educação baiana. Revista da Bahia. Salvador, v.32, n.31, jul. 2000. p.70-83.

Anísio Teixeira e a Autonomia da Educação Baiana

Edivaldo M. Boaventura

É na condição de secretário da Educação do governo Octávio Mangabeira (1947-1951) que Anísio Teixeira influiu ponderavelmente para a autonomia dos serviços estaduais de educação. Como secretário teve oportunidade de expor e discutir as suas idéias sobre democratização e Educação, em 1947, quando a Assembléia Legislativa baiana discutia o projeto da terceira Constituição do estado da Bahia. O documento para análise chama-se "Fundamentação do capítulo de educação e cultura na Constituição do Estado" (Teixeira, 1968).

Depois, ele apresentou o "Projeto de lei de organização autônoma dos serviços educacionais" (Teixeira, 1965).

Esses dois documentos sao essenciais para a história da Educação da Bahia, não somente na década dos anos quarenta como também para a compreensão da Lei Orgânica do Ensino de 1963.

A Constituição Federal de 1946 colocou maiores responsabilidades educacionais para os estados-membros, embora esta medida estivesse na dependência da regulamentação do dispositivo sobre a competência da União de legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional. Nesse processo de descentralização, os conselhos estaduais de educação deveriam representar, como organismos colegiados, importante papel. A idéia central foi a de que só haveria sistema de educação, previsto na Lei Maior, com o respectivo colegiado, traçando normas deliberativas, opinando e decidindo à base de resoluções próprias.

Apesar de não se encontrar em funcionamento regular desde o final da década de quarenta, o Conselho de Educação na Bahia, constituía-se numa instituição centenária. Para a sua recriação concorrerarn dois fatores preponderantes - a influência das idéias de Anísio Teixeira, que propugnava por um colegiado poderoso, como previu a Constituição baiana de 1947; e o impacto das políticas federais para a organização dos colegiados estaduais expressas na Lei de Diretrizes e Bases de 1961. Do encontro dessas duas orientações emergiu o Conselho Estadual de Educação e Cultura da Bahia, em 1963 (Teixeira 1965).

Antecedentes

Durante o período da República Velha o Ministério da Justiça e Negócios Interiores, corn assistência de outras instituições educacionais foi o encarregado de administrar problemas de educação, não obstante o curto período de existência do Ministério da lnstrução Pública, Correios e Telégrafos, criado no governo provisório, para Benjamin Constant Botelho de Magalhães. Quanto aos conselhos de Educação, especificamente em âmbito nacional, A. Carneiro Ledo (1924) criticou o Conselho Superior de Ensino. Agnes E. Toward (1966), por seu turno, identificou, antes de 1930, alguns colegiados, entre eles o Conselho Diretor de lnstrução Pública e o Conselho Nacional de lnstrução.

Fernando de Azevedo (1958) esclareceu que depois do Pedagogium, criação de Benjamin Constant em 1890, somente em 1911, com a Lei Orgânica, surgiu esse Conselho Superior do Ensino. E mais, pela reforma Rocha Vaz, em 1925, foi transformado em Conselho Nacional de Ensino. Após 1930, funcionou permanentemente o Conselho Nacional de Educação, definido por A. Almeida Júnior:

órgão colaborador do Poder Executivo no preparo de ante-projeto de lei e na aplicação de leis referentes ao ensino e consultivo dos poderes federais e estaduais, em matéria de educação e cultura,

conceito que tem por base a lei número 174, de 6 de janeiro de 1936 (1956). Uma das atribuições desse Conselho era estabelecer o Plano Nacional de Educação, competência que cumpriu, enviando ao presidente da República, desafortunadamente, às vésperas do golpe de estado de 1937. O Conselho Nacional de Educação continuou operando até à promulgação da Lei de Diretrizes e Bases de 1961.

Os antecedentes do Conselho de Educação da Bahia, no âmbito da organização estadual, remontam ao tempo da província a partir de 1842. Segundo estudos de Raimundo Mata (1982), o primeiro colegiado foi instituido pela Lei Provincial nº 172, de 25 de maio de 1842, com o nome de Conselho de Instruição Pública, posteriormente criado o cargo de Diretor-Geral dos Estudos, em 1849. Em 1861, todavia, a Bahia passou a contar com o Conselho Superior de Instrução Pública, reestruturado pela reforma João José Barbosa de Oliveira, líder da educação provincial e pai de Rui Barbosa. Em 1881, com a reforma Aragão Bulcão, o colegiado baiano passou a denominar-se Conselho de Ensino Provincial, dele fez parte o próprio Rui, na qualidade de "cidadão distinto nas letras e nas ciências". Na República a tradição colegiada se manteve. O governador Manuel Vitorino reformou inteiramente o Conselho e o dividiu em comissões, tendo dele participado, dentre outros, Antônio Pacífico Pereira e Ernesto Carneiro Ribeiro. O governo Hermes da Fonseca assumiu "a suprema direção do ensino..., que a exercerá por intermédio do diretor-geral da lnstrução Publica", conforme o Regulamento de agosto de 1890, que relacionou o Conselho Superior de Ensino. Tempos depois, na reforma de 1925, no governo Góes Calmon, o Conselho foi estruturado e permaneceu até mesmo depois de 1930 (Tavares, 1968 e 1981, MEC/INEP, 1959).

A Constituição Federal de 1934 instituiu a parelha de Conselhos Nacional e Estaduais de Educação. Dando curso à essa diretriz, o governo da Bahia, ao criar a Secretaria da Educação e Saúde e Assistência Pública, pelo decreto número 9.471, de 22 de abril de 1935, estabeleceu o Conselho Superior de Educação.

Conforme Raimundo Mata, foi a primeira vez que a palavra Educação passou a denominar o colegiado substituindo o vocábulo Instrução, que vinha desde o Império. A terminologia logo foi mudada para Conselho de Educação e Cultura, de acordo com a segunda Constituição da Bahia, promulgada em 20 de agosto de 1935. Este Conselho era um dos Conselhos Técnicos previstos pela própria Lei Fundamental da Bahia. O texto constitucional preconizava outros, como o Conselho de Assistência Municipal. O Conselho de Educação e Cultura - quando as duas funções aparecem juntas - foi regulamentado pela Lei nº 18, de 12 de dezembro de 1935 e com posto de acordo com o Decreto nº 9.844, de 26 de dezembro do mesmo ano. Edith Mendes da Gama e Abreu, professora e acadêmica, membro efetivo deste Conselho, assim se pronunciou:

O velho Conselho foi composto de Agripino Barbosa, diretor-geral do Departamento de Educação e seu presidente, dos diretores da Escola Normal e do Ginásio da Bahia, do presidente da Associação dos Professores Primários e de duas pessoas notoriamente dedicados aos estudos de problemas sociais... Nós não recebíamos nada pelos serviços prestados tão somente o reconhecimento dos relevantes serviços prestados à educação baiana (Gama e Abreu, 1980).

Esse Conselho foi, por seu turno, reformado, em 1940, quando secretário da Educação Isaías Alves. Assinou o decreto não o interventor Landulfo Alves, mas o interino em exercício Lafayette de Azevedo Pondé que, quarenta anos depois, presidiu o Conselho Federal de Educação. Por esse Decreto nº 11.762, tornou-se um organismo técnico auxiliar da Secretaria da Educação. Mantinha-se, assim, a organização básica dos conselhos de educação, conforme descreveu Agnes S. Toward (1966): os membros selecionados da elite, as responsabilidades do Conselho eram judiciais relativas às matérias pedagógicas e a natureza das decisões a tomar opinativas e consultivas.

A Situação na Bahia com a Redemocratização de 1946

A Constituição Federal de 1946 dispunha sobre a descentralização, política e administrativamente, da educação. Dentre as diversas disposições, duas se referiam à organização do sistema federal pela Unão e dos sistemas estaduais pelos estados membros. Isto é, os legisladores estaduais organizariam os seus respectivos sistemas de acordo com as diretrizes traçadas pelo governo da União. Começou, então, o ciclo das leis de diretrizes e bases, previsto na Constituição Federal de 1934, e tomou pleno curso a partir de 1948, quando o Poder Executivo enviou o projeto do LDB ao Congresso. Treze anos mais tarde, em 1961, foi aprovada a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Iniciava-se um lento processo de descentralização da administração federal para os estados.

Em 1947, o estado da Bahia passou a refletir esse clima de abertura democrática com a eleição do governador Octávio Mangabeira (1947-1951), que convidou para Secretário de Educação o antigo Diretor-Geral da lnstrução Pública do governo Góes Calmon e autor da reforma do ensino de 1925, Anísio Spínola Teixeira.

Na exposição à Assembléia em 1947, Anísio Teixeira, insistindo na democratização da vida política via Educação, ponderou sobre a autonomia dos serviços educacionais:

Que vamos fazer, portanto, para dar à Constituição da Bahia a força e vigor necessários para a reforma dos seus serviços públicos e, especialmente, educacionais?

Devo dizer que a grande revolução educacional já foi feita pela Constituição de 1946, que consagrou duas grandes medidas. Uma delas resultou de uma longa luta dos educadores brasileiros - e a que instituiu a autonomia da educação nos Estados, autonomia que é condição de liberdade, porque a centralização, antes de ser um erro administrativo, antes de ser um vício administrativo, é uma limitação da liberdade.

A Primeira oportunidade é, pois, a de sermos autônomos. A Bahia poderá realizar a reforma de sua organização educacional com a obediência tão só à lei de bases e diretrizes, complementar à Constituição Federal, lei que, importa acentuar, como os seus próprios termos o dizem, não poderá conter sendo as bases e diretrizes da educação nacional.

A segunda oportunidade é a das percentagens instituídas para educação nacional, para a União, os Estados e os Municípios. É, talvez, o artigo mais revelador da nova conscência democrática expressa na Constituição Federal. Este artigo determina que 20% das rendas estaduais, 20% das rendas municipais e 10 % das rendas federais sejam aplicadas na educação.

No projeto da Constituição baiana, os constituintes lançaram as bases e constituiram os órgãos pelos quais a educação conquista a sua autonomia e o seu próprio governo.

Longe de mim não reconhecer a audácia do plano proposto, nessa Constituição, para o governo da educação. Não é que não haja precedentes. A autonomia de certos serviços públicos é uma idéia velha e já não são raros os exemplos de sua aplicação. Mas pela primeira vez, tenta-se a autonomia para serviço da vastidão e importância do serviço educacional.

A Educação na Constituição da Bahia de 1947

A terceira Constituição do estado da Bahia, em 1947, estava possuída dessas idéias democráticas e de descentralização do ensino. Um longo capítulo "Da Educação e Cultura", por direta inspiração de Anísio Teixeira, dispunha, no Art. 177:

A função da educação e ensino compete ao Estado, na forma da Constituição Federal, incumbindo sua superintendência e direção ao Conselho Estadual de Educação e Cultura, órgão autônomo, administrativa e financeiramente, nos termos desta Constituição e da lei orgânica do ensino.

Determinou ainda a Constituição que os membros do Conselho fossem nomeados pelo governador com aprovação do Poder Legislativo. A presidência cabia ao Secretário de Estado dos negócios da Educação. Além disso, o Conselho elegeria três pessoas de notório saber em questões de ensino, dentre as quais o governador escolheria o diretor da Educação e Cultura, Art. 117, § 4º:

Ao diretor de Educação e Cultura competem, as funções de administração do sistema estadual de ensino e cultura, inclusive o exercício do poder disciplinar, e, nos termos da lei orgânica e com aprovação do Conselho, nomear, promover, aposentar, exonerar ou demitir os membros do magistério e funcionários de educação e cultura.

A Constituição Estadual de 1947 previu também a existência de Conselhos Municipais. Estabelecido, dessa maneira, constitucionalmente, o Conselho, a discussão, de 1947 a 1963, girou em torno do projeto de lei orgânica do ensino. A Carta de 1947 e o projeto de lei orgânica são dois documentos que expressaram a concepção de Anísio Teixeira, particularmente acerca do controle dos serviços educacionais pelo colegiado. O projeto de lei orgânica, retendo o conceito original de conselho de educação como apareceu na Constituição de 1947, estabeleceu que o conselho era órgão autônomo e administrativo do sistema. Tal o conceito de conselho proposto por Anísio Teixeira, inspirado na administração norte-americana. Para Anísio, a educação deveria ser de responsabilidade de cada estado-federado. Previu, ainda, que os conselhos planejariam os meios para a Educação em nível federal, estadual e municipal. Acreditava que a autoridade e a responsabilidade deveriam ser repartidas pelas organizações administrativas compostas de leigos e representantes outros das comunidades e, assim, a Educação deveria possuir razoável grau de autonomia.

De acordo com o seu pensamento, o Conselho Estadual seria composto por pessoas aprovadas pelo Legislativo. Caberia ao Conselho, dentre muitas outras funções, alocar recursos financeiros derivados dos impostos estaduais, gozando para tanto de total autonomia. A propósito, referiu-se à experiência colonial da Santa Casa de Misericórdia, que detentora de considerável patrimônio, o geria, com total autonomia em face do estado.

Pelo seu ponto de vista, a educação era organizada e administrada pelo conselho. O governo dever-lhe-ia delegar a responsabilidade de administração. Entre os conselhos federal, estaduais e municipais seria dividida a soma de recursos financeiros, coletados para fins educacionais. Estes três implementariam os procedimentos administrativos para prover os serviços educacionais.

No caso, o Conselho Estadual de Educação da Bahia era dotado de poderes legislativos para formular e propor políticas. Já a implantação das suas deliberações estava a cargo do Diretor da Educação, indicado, como vimos, ao governador, pelo Conselho. Essas idéias foram debatidas na Assembléia Estadual da Bahia, conforme exposição do próprio secretário Anísio Teixeira, em 1947 (Teixeira, 1965).

Propõe, então, um órgão colegiado para gerir autonomamente a educação:

A sugestão do Conselho, de um pequeno colégio de personalidades nasce do propósito de confiar obra tão ampla ao pensamento concertado de várias cabeças. Se isto enfraquece, sob certos aspectos, a unidade da ação, por outro lado conduz àquela sábia e equilibrada orientação necessária em empreendimentos de real magnitude. Mas, o projeto prevê ainda a correção de qualquer possível dispersão de objetivos. Este conselho tem funções de deliberação, funções que chamaríamos legislativas, se os nossos termos jurídicos não tivessem sentidos tão particularmente restritos, em oposição às funções executivas. O Conselho (delibera e decide, mas não executa). A execução será confiada ao diretor de ensino, cuja nomeação é o mais importante ato de política educacional a ser praticado pelo Conselho. Com um Conselho para ponderar, deliberar e aprovar e um diretor para executar e cumprir, teremos, deveremos ter autonomia, sem ditatorialismo, a eficiência, sem extremismo.

Criado o aparelho de controle das escolas, cabe oferecer-Ihe os meios para o desempenho de suas funções. Os meios são a completa autonomia financeira, administrativa e econômica. O Conselho administra o fundo de educação, estabelece as regras para as despesas educacionais, fixa salários, orça a despesa e promove a receita da educação. Tudo isto não é para que se liberte de freios, cuidados e normas no (dispêndio do dinheiro público, mas para que se liberte da dualidade de autoridades com que se impede, entre nós, toda e qualquer eficiência do serviço público).

Vejamos agora o teor do texto definidor de política de educação na Constituição da Bahia de 1947:

Art. 117 - A função de educação e ensino compete ao Estado, na forma da Constituição Federal, incumbindo sua superintendência e direção ao Conselho Estadual de Educação e Cultura, órgão autônomo administrativa e financeiramente, nos termos desta Constituição e da lei orgânica do ensino.

§ 1º - O Conselho Estadual de Educação e Cultura se comporá, além de seu presidente, de seis membros, nomeados pelo Governador com aprovação do Poder Legislativo, dentre pessoas de reputação ilibada, renovando-se de dois em dois anos, pelo terço. O Conselheiro perderá o mandato nos casos previstos na lei orgânica do ensino.

§ 2º - O Conselho, cujas atribuições serão especificadas na lei orgânica do ensino, funcionará sob a presidência do Secretário de Estado encarregado dos negócios da educação, seu membro nato, ao qual, além das funções definidas na mesma lei, competirá:

I - fiscalizar o fiel e exato cumprimento da lei orgânica do ensino;

II - velar pela boa marcha dos negócios da educação e ensino, de acordo com as deliberações do Conselho;

III - apresentar anualmente ao Governador, e, por intermédio deste, à Assembléia Legislativa, completa exposição sobre os negócios da educação e do ensino.

§ 3º - O Conselho elegerá, por maioria absoluta, três pessoas de notório saber em questões de ensino, dentre as quais o Governador escolherá o Diretor da Educação e Cultura, cujo mandato será de quatro anos, somente sendo permitida sua destituição nas hipóteses reguladas na lei orgânica do ensino.

§ 4º - Ao diretor de Educação e Cultura competem as funções de administração do sistema estadual de ensino e cultura inclusive o exercício do poder disciplinar, e, nos termos da lei orgânica e com aprovação do Conselho, nomear, promover, aposentar, exonerar ou demitir os membros do magistério e funcionários de serviços de educação e cultura.

Em suma, a concepção de Anísio Teixeira era a de um conselho autônomo, com poderes para tomar decisões legislativas e opinativas. O Conselho não prestaria assistência técnica diretamente As entidades, funções do diretor, que supervisionaria o sistema educacional. Além do Conselho e do diretor, estava prevista a figura do secretário de Estado dos negócios da educação, com responsabilidades distintas e encarregado de estabelecer a ligação entre o governo e essa agência autônoma. Entre as atribuições do secretário incluia-se a de presidir as reuniões do Conselho.

O Projeto de Lei Orgânica do Ensino

O projeto de lei orgânica, com essas e outras atribuições, foi enviado à Assembléia pelo governador em 1947, com a justificativa do secretário Anísio Teixeira (1965). Dentre as emendas, destacaram-se as do deputado José Mariani, que trouxe uma significativa contribuição à proposta. Advogada um Conselho autônomo, para o qual precisou uma lista de funções. Para Mariani, o Conselho seria como um pequeno legislativo. Durante o período de 1947 a 1952, a Assembléia tratou da educação média e de leis sobre professores, só voltando a discutir o projeto do secretário Anísio Teixeira muito tempo depois. Por longo período, não houve qualquer debate do projeto, especialmente de 1952 a 1959 (Bahia, Educação e Cultura, 1965).

Por volta de 1959, o deputado Bolívar Santana reativou o projeto. Para tanto, houve colaboração da assessoria do secretário da Educação com a elaboração de novos documentos enviados à Assembléia. Os estudos realizados pelo assessor Francisco Pinheiro Lima Júnior mostraram o papel do secretário, bastante enfraquecido, e a necessidade de autonomia para o Conselho e para o Departamento de Educação e Cultura (Bahia, Educação e Cultura, 1965).

O Poder Executivo estadual, em face da promulgação da lei de diretrizes e bases, estabeleceu um Conselho Técnico, pelo Decreto 18.620, em novembro de 1962, que funcionou até março de 1963, respondendo, assim, às condições gerais da lei federal de 1961. A solução imediata foi adotar o antigo Conselho de Educação e Cultura, reestruturado pelo Decreto 11.762, de 21 de dezembro de 1940.

Enquanto o governo baiano deu essa solução de emergência, prosseguia no Legislativo a discussão da lei orgânica, estimulada depois de 1961, pela promulgação da LDB. Pondere-se, todavia, que os conselhos estaduais de acordo com a LDB deveriam ser organizados pelas legislações estaduais, contanto que respeitassem certas indicações, como a seleção dos membros, que deveria ser a base da reputação do pessoal, nomeados pela autoridade competente, incluindo representantes dos diversos graus de ensino e do magistério oficial e particular, de notório saber e experiência em matéria de educação.

Lei Orgânica do Ensino de 1963

O Conselho, enfim, foi organizado conforme dispõe a lei orgânica do ensino de 1963. As referidas políticas federais, formuladas em 1961, tiveram mais influência no final da discussão. Embora já revogada do ponto de vista jurídico, todavia, a lei orgãnica constituiu-se em importante fonte para a interpretação dessa fase do Conselho. Por ela, pode-se analisar o conceito, propósitos, organizações, composições e funções do diretor do Departamento Estadual de Educação e Cultura e bem assim do secretário, durante os primeiros anos de funcionamento do Conselho, isto é, de 1963 a 1967. Três direções lideravam administrativamente a educação: o Conselho, o diretor do departamento e o secretário de Estado, todos três funcionando ao mesmo tempo.

Quanto ao Conselho, a lei incorporou as idéias de Anísio Teixeira e do deputado José Mariani. Quando essa lei foi promulgada, a Constituição baiana de 1947 ainda se encontrava em pleno vigor. Tanto os legisladores como o Executivo, tiveram de respeitar os dispositivos constitucionais que regulavam boa parte do Conselho. E, em 1963, a situação do educacional se diferenciava bastante da de 1947. O Conselho era uma agência colegiada poderosa, autônoma, que legislava com funções de controlar os serviços educacionais e culturais.

Conselho e diretor eram os elementos de maior peso nas decisões. O propósito maior da legislação foi criar um organismo independente para atuar na educação. O Conselho, como corpo legislativo, tinha poderes de formular tipos de padrões e de normas para criar escolas, administrar fundos, preparar orrçamento e fazer planos educacionais. Compunha-se do presidente, que era o secretário da Educação e Cultura e mais seis membros, indicados pelo governador e aprovados pela Assembléia com seis anos de mandato, renovável um terço em cada dois anos.

O diretor era o encarregado administrativo, com a função de implementar as decisões do Conselho. Era escolhido pelo governador, de uma lista de três pessoas, selecionada pelo Conselho, servindo durante quatro anos com possibilidade de dois mandatos. Ao diretor cabiam as iniciativas dos projetos, programas, estudos e outras, dentro da estrutura legal do Conselho.

A terceira figura, o secretário presidia as reuniões do Conselho e supervisionava a educação do estado. Não lhe era permitido interferir na esfera administrativa da educação. Esperava-se que desempenhasse um papel de ligação entre essa agência educacional autônoma e o governo.

Aprovada a lei Orgânica, o governador nomeou os membros do Conselho, cujas indicações foram acatadas pela Assembléia, em junho de 1964. Para tanto, os candidatos expressaram, aos membros do Legislativo, os seus pontos de vista sobre educação. A AssernIdéia aprovou todos os nomes propostos e mais os dos seus respectivos suplentes. Em dezembro de 1964, o governador empossou o Conselho e, em janeiro seguinte, foi elaborada a lista dos candidatos ao posto de diretor.

Decretos e depoirnentos de pessoas vinculadas à educação, com conhecimento de causa, descreverarn os aspectos positivos e negativos dessa liderança tripartida de janeiro de 1965 a maio de 1967. O primeiro diretor do Departamento de Educação e Cultura deixou o posto de secretário da Educação para ocupar aquele cargo, permanecendo nele por pouco tempo, pois veio a falecer em agosto de 1965. O segundo, membro do Conselho, por sua vez, licenciou-se do cargo, em fevereiro de 1966, para ocupar a Secretaria da Educação, sendo substituído por um suplente, ficando a direção do Conselho oficialmente resguardada.

Na tradição política brasileira, o secretário da Educação tem sido sempre um cargo de prestígio com posição bem definida junto ao governador, o que Ihe permite traçar estratégias de governo. Com essa concepção de Conselho, o secretário não desempenhava tais atribuições.

Ern suma, a criação do ConseIho, longamente esperado, não correspondeu às expectativas. Além das competências estipuladas pela LDB, a lei orgânica agregou mais outras num total de 78 (setenta e oito) atribuições, que puderam ser classificadas em normativas, deliberativas, opinativas e judiciais.

Dois elementos formativos entravam em contradição no funcionamento do Conselho - a concepção de Anísio Teixeira, que batalhou por uma agência autônoma e as competências da LDB. Os legisladores tiveram de definir e combinar idéias e atribuições dessas duas tendências num organismo, cujas atribuições e resoluções de cúpula eram exercidas por três diferentes pessoas, mas com hierarquia de igual valor na área de sua competência. Tal situação só pôde ser reformada sob as determinações contidas na Constituição Estadual de 1967, ajustando-o aos moldes do Conselho Federal de Educação.

Assim, por influência do "Projeto de lei de organização autônoma dos serviços educacionais do Estado da Bahia" (Teixeira, 1965), elaborado pelo secretário Anísio Teixeira e enviado ao Legislativo baiano em 1947 e, por outro lado, pelo condicionamento da lei complementar da Constituição Federal de 1946, surgiu a lei orgânica do ensino de 20 de setembro de 1963. O legislador baiano procurou conciliar essas duas orientações num só texto legal. É bem patente, nessa concepção, a influência das juntas de educação norte-americanas. Evidentemente que o funcionamento dessa autarquia com três comandos trouxe dificuldades de operação durante o período de funcionamento. O governo Luis Viana Filho tomou a iniciativa de rever a situação, inclusive aproveitando a oportunidade da Carta constitucional baiana de 1967.

Interessante notar que já em 1966 o governo estadual propôs uma ampla reforma administrativa, onde previu três conselhos, um para a educação, outro para a cultura e um terceiro para o desporto. No referido projeto de reforma, afirma-se que o Conselho Estadual de Educação teria funções normativas, deliberativas e opinativas. A reforma administrativa foi aprovada, com exceção do setor educação e cultura. Já naquele projeto de reforma, o modelo conceitual é similar ao do Conselho Federal de Educação. Observou-se que tanto o Executivo como o Legislativo que aprovaram a lei orgânica do ensino foram os mesmos que outorgaram a reforma administrativa, ficando de fora a educação e a cultura (Bahia, Lei n9 2.321/1966).

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