TEIXEIRA, Anísio. Análise de sistemas e educação.Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Rio de Janeiro, v.59, n.129, jan./mar. 1973. p. 57-59.

"Systems Analysis" e Educação

Anísio Teixeira

Há cerca de uma década surgiu e vem-se desenvolvendo um método novo de se lidar com problemas de educação. Trata-se do que se vem chamando análise de operações, ou análise de sistema, "systems analysis", e consiste, em essência, numa forma nova de considerar, analisar e raciocinar sobre dados de uma situação educacional.

Anteriormente, tornavam-se as informações e os dados estatísticos e, depois de analisá-los e apreciá-los, emitia-se um julgamento qualitativo: estava tudo muito bem, ou muito mal, ou mais ou menos. Aceitava-se a situação estabelecida como não modificável e procurava-se medi-la e julgá-la.

Hoje, os dados e as informações são analisadas à luz das condições e fatores que os produziram e se examinam alternativas viáveis para mudar ou alterar a situação. Todos os elementos são levados em conta e, considerada a situação como um todo, um sistema interligado e inter-relacionado, propõem-se mudanças e alternativas a serem apreciadas em face dos resultados.

A idéia de jogo

A idéia de sistema, no fundo, é a de que a situação é uma espécie de "jogo": um conjunto de peças diferentes atuando e inter-reagindo para certos resultados. No jogo, propriamente dito, as peças são fatores precisos e uniformes, as "regras" do jogo também precisas e uniformes, os resultados também precisos e uniformes e daí, nada mais ter o jogador que fazer do que usar as alternativas e divertir-se com o resultado.

É esse método que hoje se está introduzindo na problemática da guerra, do comércio, da produção e, de 1965 para cá, da educação. Para se compreender o que se passa, é indispensável ter em vista a escala de qualificação, a densidade de organização e o grau de homogeneização a que vem chegando a vida em conseqüência dos processos maciços de "produção" e de organização que a estão modelando. Esses processos, que atingem todos os aspectos da vida, vêm homogeneizando a casa, o vestuário, a alimentação, o transporte, o prazer, a religião, o pensamento, o trabalho, fazendo, enfim, do homem o seixo rolado em que vem ele inconformadamente se transformando.

A teoria do jogo só é aplicável em situações assim desenvolvidas, cujo grau de homogeneização e uniformidade é suficientemente alto, para que os fatos ou fatores possam ser identificados como peças, exercendo funções similares às das peças de um jogo. No jogo, há o objetivo geral, vago: ganhar o jogo; e há os objetivos particulares, detalhados: os passos do jogo, as jogadas, o fim e os meios, estes como frações do fim.

Algo semelhante é que se dá com as situações de guerra, de comércio, de produção, em que o objetivo geral é um só: ganhar a guerra, obter o lucro, fabricar o produto - e também com a educação, embora aí a situação seja bem mais complexa, pois os fins da educação são vários e múltiplos. Mas, começa-se a pensar em torná-los objetivos e precisos.

Acompanhando, coordenando, ou dirigindo a situação, tenho que tomar decisões. Para isto, preciso de todos os fatos a fim de descobrir o que devo buscar, as alternativas com que posso conseguir e os resultados que posso antecipar. A educação vai depender dessas decisões tomadas agora à luz de alternativas mais ricas, mais flexíveis e mais lúcidas e não, como dantes, numa única abordagem global para a solução também única e global do problema.

A imagem do "jogo" que usamos para melhor elucidar o conceito da análise operatória, isto é, o conceito de um sistema em operação, é apenas analogia. Com efeito, o jogo é um sistema "fechado", com regras "fixas", caindo todas as alternativas "dentro" das "regras" estabelecidas. Nas situações educacionais, os problemas são mais "abertos", pode-se examinar alternativas novas, ou seja, regras novas para o jogo. O "systems analysis" lembraria o caso do jogador de futebol que tomou a bola e correu para o gol, criando o rugby: nova forma de jogo. Como a situação não é a situação mecânica e fechada do jogo, mas algo flexível, com diversidade de objetivos e resultados, a "teoria" de jogo tem de ser aplicada à vista de toda uma rede de conseqüências, como se cada situação constituísse "uma forma" de jogo e não simples diversificação do mesmo jogo.

É esse fato último que destruiu o mito do computador como o elemento de controle das situações educacionais, pondo-o, ao contrário, como simples servo de seu senhor que é o mestre e o educador.

O problema da homogeneidade

No país subdesenvolvido, não é esse o perigo, pois estamos ainda longe do computador. O perigo é mais elementar e, como o vejo, está, sobretudo, em que a "situação educacional" não tem ainda a homogeneidade necessária para nela se identificarem uniformidades e podermos torná-las objetos de raciocínio e análise. Cada situação é uma situação diferente - pois são diferentes os professores, as condições da escola, os alunos, o material disponível para educação etc.

Para a "análise do sistema" poder ser praticada, há de haver, primeiro, uma rigorosa classificação dessas situações, para se caracterizarem algumas "uniformidades" sobre as quais se possa pensar e argumentar com lógica e plausibilidade.

A padronização geral já conseguida nos países desenvolvidos permite a utilização do método, dentro das limitações e das complexidades dos objetivos educacionais, muito menos simples do que os da guerra, do comércio, ou mesmo da produção.

Entre nós, o método somente será possível em situações educacionais em que um mínimo de uniformidades quanto ao mestre, às condições materiais, ao programa e aos métodos tiver produzido o grau de padronização e homogeneidade necessário para a validade e raciocínio e dos cálculos. Daí não ser generalizável senão às situações desenvolvidas do nosso esforço educacional, quando tenhamos atingido grau realmente alto de padronização e homogeineidade. Presentemente, cada situação educacional é uma e só pode ser comparada com ela própria.

| Scientific Production | Technical & Administrative Production | Literature about the Educator |

| Journal articles | Chapter of book | Speeches | Pamphlets |
| Books | Prefaces and Postfaces | Text in book flaps |
| Unpublished papers | Conference papers | Translations |