TEIXEIRA, Anísio. Prefácio. In: LEITE LOPES, J. Ciência e desenvolvimento; ensaios. 2ª Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1987. 246p. [Biblioteca Tempo Universitário, 81].

PREFÁCIO

O professor Leite Lopes reúne, neste pequeno livro, diversos escritos seus, publicados em revistas e jornais, ao longo de mais de uma década de esforços pela definitiva integração das atividades de pesquisa científica na universidade brasileira.

Trata-se de contribuição importantíssima,que um cientista de alta categoria julgou dever prestar ao país, com sacrifício do seu trabalho pessoal de pesquisa, para levar-nos a compreender, já na segunda metade do século XX, a transformação que deveria sofrer a universidade entre nós, a fim de acompanhar a transformação já operada nas universidades européias e americanas desde o século XIX, ou, pelo menos, primeiras décadas do século XX.

Seu trabalho lembra a batalha pela nova idéia de universidade, que se esboça na França, vem a ser definitivamente formulada na Alemanha de Humboldt e na Holanda e daí se expande pela Inglaterra e afinal atinge com Abraham Flexner os Estados Unidos. Em essência, essa idéia é a de que a universidade não é só a transmissora da cultura do passado mas a elaboradora da culturado presente e, por fim, a grande produtora de conhecimentos e de saber, em que se fez nos dias de hoje.

Muitas vicissitudes sofreu essa instituição do saber, sob tantos aspectos peculiar e única, nos seus já longos sete séculos de existência, mas jamais deixou de se revelar uma das mais conservadoras instituições da sociedade humana formada, depois da extensa e fecunda fermentação medieval, a partir do século XII.

A despeito de mudanças, por vezes, substanciais, por que passou e passa a sociedade humana, a universidade, guardando aspectos oriundos de seu berço medieval, conserva sempre como que seu caráter de guild e mantém-se irredutivelmente conservadora e até, de certo modo, fechada e impermeável às mudanças sociais.

Há em sua missão uma ambigüidade intrínseca entre o devotamento ao saber e o caráter inevitavelmente dinâmico do saber. Daí o paradoxo de seu conservadorismo e de sua inegável contribuição ao progresso humano. Acaba transformando-se, mas sempre a lutar implacavelmente pela permanência de sua imagem anterior. Na França, na Alemanha, na Inglaterra, nos Estados Unidos foi áspera, difícil e longa essa laboriosa transformação.

Como é, por excelência, uma instituição bâtie en hommes, depende para sua mudança da mudança do homem universitário, e este homem é o professor e o seu guild, a congregação de professores. Sem esse professor mudar, não muda a universidade. Em alguns casos, sobretudo nos Estados Unidos, certos reitores, um tanto ditatoriais, como Elliot em Harward, apressaram um pouco a transformação, mas esta só se efetiva e consolida com a mudança pessoal e íntima do professor. Ele é que é a peça essencial que move e nutre esse complexo um tanto misterioso que constitui a universidade, instrumento imóvel da extraordinária dinâmica da inteligência humana.

Por isto mesmo é que o combate pela sua transformação requer a contribuição do próprio professor. É quando ele, como Leite Lopes, sai fora de seu remanso universitário e se faz batalhador, pregador, apóstolo de uma mudança, por vezes, negada até pelo próprio batalhador em seu comportamento individual de professor, que se pode ter esperanças de ver a universidade mudar.

Em quase todos os casos, trata-se de professores que foram viver em outras universidades as mudanças já ali ocorridas e, assim convertidos, se fazem, então, os rebeldes em suas próprias universidades nacionais. Assim foi na Inglaterra, assim foi nos Estados Unidos e assim há de ser aqui no Brasil. O intercâmbio entre as Universidades é que promove as mudanças. O rebelde aqui já é um conservador de outra universidade que freqüentou e de que se fez um novo devoto. Devoto e conservador continua sempre ele. Agora é de uma nova fé.

Leite Lopes e seus companheiros de liça são tais novos devotos. As armas de batalha estão todas nos magníficos trabalhos, ora consolidados em livro, deste professor exemplar e cientista de alta estirpe, que é o Autor do livro. Precisamos todos delas para ajudarmos o movimento de transformação, que, longe de concluído, está apenas a esboçar-se.

ANÍSIO TEIXEIRA

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