TEIXEIRA, Anísio. Centros de treinamento de professores primários. In: Conferência sobre Educação e Desenvolvimento Econômico e Social na América Latina. Santiago do Chile, 5-19 mar. 1962. Santiago, 1962. 8p.

ANÍSIO SPÍNOLA TEIXEIRA

CENTROS DE TREINAMENTO DE PROFESSÔRES
PRIMÁRIOS

(PLANO APRESENTADO À CONFERÊNCIA SÔBRE EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL NA AMÉRICA LATINA, REALIZADA EM SANTIAGO DO CHILE, DE 5 a 19 DE MARÇO DE 1962)

CENTROS DE TREINAMENTO DE PROFESSÔRES
PRIMÁRIOS

Anísio S. Teixeira

Tôdas as reformas e desenvolvimentos em marcha estão a depender fundamentalmente, da adequada formação de professôres.

Será neste setor que residirá um dos esforços maiores do Ministério da Educação, em sua nova fase, como órgão de propulsão dos vinte e um sistemas educacionais, dos Estados, que a Lei de Diretrizes e Bases veio a ampliar aos três níveis de ensino (antes, sòmente o ensino primário estava sob o contrôle dos Estados) e como administrador do sistema federal de ordem apenas supletiva.

Ao lado do auxílio financeiro, pelo qual a União buscará restabelecer o equilíbrio entre os contrastes econômicos das diversas regiões do país, cogita ela de ampliar os seus serviços de assistência técnica, dando especial ênfase à preparação do magistério.

Como as chamadas escolas normais e cursos de regentes vêm sendo transformados, cada vez mais, em cursos de nível médio, para o que concorreu sobremodo a adoção dos ginásios secundários como seu primeiro ciclo, torna-se possível a criação de novas modalidades de formação do magistério, com a instalação de centros do treinamento, destinados aos que tenham concluído os estudos de segundo nível, no primeiro ou segundo ciclo e desejem devotar-se ao magistério.

Êstes centros seriam substancialmente centros de demonstração de ensino, desde o nível de jardim de infância, até a última série do segundo nível, com jardins de infância, escolas primárias e escolas de segundo nível, nos quais grupos de estagiários entre 200 e 300 viriam residir, como internos para treinar e estudar as artes do magistério infantil, primário e médio.

Os estudos seriam rigorosamente articulados com essa prática direta do ensino. As escolas - funcionando como hospitais de clínica nas escolas de medicina - existiriam em três modalidades: escolas de demonstração, escolas experimentais e escolas de prática. Dado o volume de professôres a preparar e aperfeiçoar, tais escolas devem ter a amplitude necessária para permitir o treino individual. Ao lado das escolas de demonstração e experimentais, que poderão ser razoàvelmente pequenas, haverá escolas de prática, com classes em número suficiente para o treinamento individual, aproveitando-se as próprias escolas do sistema escolar vizinho.

Êstes Centros deverão, com efeito, ser localizados, de preferência, em cidades ou próximos a cidades que ofereçam tais oportunidades.

A criação de 40 dêsses Centros nos vinte e um Estados brasileiros representaria a cooperação específica do Govêrno Federal na sua obra de assistência técnica aos Governos dos Estados. Representaria isto, entretanto, tamanho investimento que seria de crer pudessem vir a contar com auxílio internacional, à maneira de certos tipos de ajuda que tanto o Ponto IV quanto a UNESCO vêm oferecendo em esforços mais modestos, tais como os do Centro Regional de Pesquisas Educacionais de São Paulo (UNESCO) e os do Centro de Belo Horizonte (PABAEE-Ponto IV).

Já nos referimos anteriormente ao problema do magistério e à extraordinária proporção de mestres desprovidos de preparo pedagógico, tanto na escola primária quanto na escola média.

Nas condições atuais do ensino, entretanto, já não se trata apenas de aumentar o número de professôres diplomados pelas atuais escolas normais mas de modificar profundamente estas próprias escolas normais, lançando as bases de um tipo nôvo de formação do magistério.

Com efeito, não só a escola está a exigir do professor uma nova responsabilidade em face da mobilidade social a que fizemos menção, como também, diante de nôvo fato, que é a massa de informação que recebe o aluno fora da escola, com os atuais meios de comunicação - rádio, cinema, televisão - o que obriga o mestre a exercer antes a função de integrador dos conhecimentos, de formador do juízo crítico do aluno do que a de ser o quase único informante de antigamente, com a autoridade indiscutida do magister dixit. Êste fato junta-se, em país em desenvolvimento como o nosso, ao da explosão social provocada pela acelerada mobilidade social das camadas populares ascendentes. O professor, pois, tem duas novas funções: a de integrador e não transmissor de conhecimentos, e a de catalisador da explosão de mobilidade social vertical.

Êste nôvo mestre capaz de exercer tais novas funções, não pode ser a jovem adolescente recém-saída de uma escola de nível médio, em que se matriculou por não haver outra mais adequada ao seu sexo - mas alguém mais amadurecido, que tenha voluntàriamente escolhido o magistério para profissão e revele, dêste modo, os primeiros sinais de vocação e se disponha a um treino prático de sua arte, na base de verdadeiro aprendizado.

Êste treino se faria em grandes centros de formação do magistério com escolas experimentais e escolas de demonstração, de nível infantil, primário e médio, em que o aluno-mestre estagiasse, como interno, praticando a sua arte e estudando-lhe os aspectos teóricos, técnicos e de conteúdo.

Tais centros, destinados a 300 ou 400 estagiários, com as residências e as escolas de experiência, demonstração e prática, constituiriam conjuntos de edificações escolares de alto custo, à maneira das escolas de medicina e seus respectivos hospitais de clínicas.

Nada menos de 4.000 alunos, dos 3 aos 18 anos, se distribuiriam pelos jardins de infância (300 crianças), escolas-classe (atividades de instrução) (3.000 alunos) e escolas secundárias (700 alunos), escolas-parques (atividades de trabalho e socialização, de arte e de educação física) para os mesmos 4.000 alunos, além dos 300 ou 400 estagiários.

O modêlo dêste centro já existe no Centro Educacional Carneiro Ribeiro, da Bahia, com a capacidade de 3.000 alunos, sem incluir ainda a escola secundária.

Para êsses centros se recrutariam os candidatos ao magistério de idade a superior a 20 anos e que tivessem educação secundária ou equivalente e que seriam treinados para o magistério em 1, 2 ou 3 anos, conforme se destinassem ao ensino de jardim de infância e dois primeiros anos das escolas primárias, dos seus quatro últimos anos, ou dos dois anos seguintes na escola média. O professorado de nível de colégio continuaria a ser formado nas faculdades de filosofia, ou em faculdades de educação.

O treinamento do professor se faria pelo método do aprendizado, em classes infantis, primária e médias regidas por professôres-mestres, ajudado por especialistas de educação em currículos, programas, psicologia escolar, que debateriam, em seminários, os problemas teóricos e práticos do ensino.

Estas sumárias considerações são mais do que suficientes para indicar a magnitude do empreendimento, que se justifica em face do número de mestres a formar e da necessidade de ampliar o sistema escolar primário e médio. O projeto é, com efeito, ao mesmo tempo, de ampliação da rêde escolar primária e média e de treinamento do magistério.

Seriam construídas nada menos de 20 salas de jardim de infância, de 100 salas de ensino primário, de 50 salas de ensino médio, de ginásios, oficinas e áreas de atividades sociais e artísticas para 4.000 crianças, e, além disto, residências para 300/400 estagiários e edifícios de aulas e estudos para êsse número de alunos - mestres. O mínimo de meio bilhão de cruzeiros seria o custo das construções, não podendo ser a verba de custeio de cada centro inferior a 300 ou 400 milhões de cruzeiros anuais. Seriam de cêrca de 1 milhão de cruzeiros o custo de cada mestre por ano de treino.

Se fôssem construídos 40 dêsses centros, formaríamos por ano entre 12.000 e 16.000 mestres, podendo em uma década formar 120.000 ou 160.000 novos mestres.

Empreendimento dêste vulto seria dos que mais justamente podiam receber auxílio internacional. Com efeito, essa despesa aparentemente enorme, teria a contra-partida de constituir um multiplicador do progresso educacional do país. Graças a tais centros é que os propósitos de renovação escolar se concretizariam, fundando-se na formação do mestre capaz de realizá-la.

Cabendo ao Govêrno Federal, em face da nova lei de Diretrizes e Bases, ação supletiva aos sistemas estaduais de educação, nenhum outro campo parece mais propício do que êste para exercer a União a sua ação de estímulo e auxílio. Um centro em cada Estado, para servir de modêlo, constituir-se-ia um foco de irradiação de boas práticas escolares e de propulsão de todo o sistema para as necessidades novas da nação em desenvolvimento.

Receber um auxílio correspondente a 20% do investimento que representaria êsse projeto, no custo das edificações e no seu custeio, seria mais do que razoável.

Com êsse espírito é que deixamos aqui esboçadas as suas linhas principais.

| Scientific Production | Technical & Administrative Production | Literature about the Educator |

| Journal articles | Chapter of book | Speeches | Pamphlets |
| Books | Prefaces and Postfaces | Text in book flaps |
| Unpublished papers | Conference papers | Translations |