TEIXEIRA, Anísio. 1963: ano da educação. Boletim Informativo CAPES. Rio de Janeiro, n.122, jan. 1963. p.1-2.

1963: ANO DA EDUCAÇÃO *

Anísio S. Teixeira

A fala de ontem do Senhor Presidente da República a respeito da educação do povo brasileiro teve realmente um tom nôvo e diferente. Sob certos aspectos pode ser considerada histórica a sua declaração.

A monótona controvérsia sôbre educação como conseqüência do desenvolvimento e educação como sua condição - perlenga que lembra a velha questão de quem nasceu primeiro, a galinha ou o ôvo ? - foi afinal afastada, e o Presidente soube dar à escola a devida prioridade. De certo modo é ela mais do que investimento, porque a condição mesma para todos os investimentos. Aliás os próprios céticos da escola não prescindem dos educados para qualquer investimento. Preferem apenas que se obtenham educados por imigração. Querem os já escolarizados em outros países.

O ceticismo dos "realistas" - e nisto com certo fundamento - não é da escola em si, mas da escola brasileira. E aí está, verdadeiramente, tôda a tragédia. Até para educar é preciso que já haja educados. Nenhum empreendimento é mais a famosa boot-strap operation do que êste da escola. Temos que nos suspender a nós mesmos pelos cadarços de nosso sapatos.

Dêste impasse, entre "líricos" que acham a escola algo que se improvisa e "realistas" que nos mandam esperar até que nos desenvolvamos, isto é, nos eduquemos, para então criarmos nossas escolas - é que temos de sair. Mas, como? Como dêle saíram todos os povos. E nós, com a vantagem de que podemos aprender de sua experiência. Seria mais fácil se tivéssemos começado mais cedo. Faltou-nos, contudo, motivação. Faltou-nos propósito. Faltou-nos determinação.

É esta que parece haver afinal chegado. Êste ano, que se encerra com a esplêndida oração do Presidente e que já estava marcado pela ascenção da vigorosa juventude de Darci Ribeiro à liderança educacional do país - êste ano parece ser o início de uma nova era na vida escolar do país. O programa que ontem esboçou o Presidente conta com recursos - primeiro sinal de sua seriedade - e obedece a um planejamento e a certa sistematização. Não vai realizá-lo só o govêrno federal, mas todos os governos estaduais e todos os municipais, apelando ainda o Presidente para a boa vontade de todos os que já contam com o privilégio da educação.

E a grande operação não é da simples expansão das escolas, mas a do seu aperfeiçoamento e de sua expansão, após melhorar-lhe a qualidade. Aí é que está o segrêdo do suspender-se a si mesmo da escola.

Seja lá qual fôr a nossa impaciência, temos que realizar algumas graves experiências de demonstração do que sejam boas escolas. E dêste exemplo partir para a expansão. São estas experiências que se irão realizar com os centros de treinamento do magistério. As escolas serão o que forem os seus professôres.

Nada menos de quarenta centros de treinamento do magistério projeta instituir o govêrno federal nos próximos oito anos. E talvez dezoito, nos próximos três anos. Tais centros serão centros de demonstração, com escolas primárias de alto nível, em que, pelo método de aprendizado, farão a sua formação, melhor diria, seu tirocínio, os professôres dos professôres brasileiros. Cada um dêsses professôres de alto nível será um supervisor, que tomará a seu cargo aperfeiçoar cinco ou dez professôres comuns. Dêste modo, partindo de um bom padrão, tentaremos generalizar êste bom padrão. Com isto desejamos, sobretudo, atender aos "realistas", a que não falta razão quando descrêem da escola improvisada, inadequada e ineficiente.

Educação é como tratamento. Há o bom e há o ineficaz. E ninguém sabe mais disto do que os já educados. Só os ineducados concebem a educação ineficiente. A tragédia do país subdesenvolvido é que lhes falta a fiscalização dos já educados, tornando-se melancòlicamente fácil fazer passar gato por lebre.

Dos muitos aspectos do nôvo plano nacional de educação, quero assim, acima de todos, sublinhar êste. O plano trienal para que nos convocou o Presidente da República não é, pois, mais uma panacéia educacional, mas o esfôrço total da nação para implantar um sistema educacional que nos emancipe e forme o nacional como se formaria o imigrante de que antes podíamos depender. A escola brasileira terá de ser uma escola que em nada se envergonhe das escolas dos países desenvolvidos. É assim que a queremos - nós, das classes privilegiadas - para os nossos filhos. É assim que a devemos desejar para o povo brasileiro.

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