Nessa altura de nossa discussão, já podemos ver que na theoria de educação de Dewey não ha separação pratica real, entre o que se apprende e o como se apprende, isto é, entre materia e methodo. Essa distincção é um acto puramente intellectual.
Methodo não é mais do que a disposição da materia de modo que a torne mais efficiente para o uso. É a propria materia orientada para certos resultados. Pode-se illustrar essa consideração com a idéa do artista e de sua technica do pianista é apenas o seu modeo se usar o piano.
Essa mesma illustração se applica ao nosso conceito de experiência como o processo do acto de apprender. Na experiencia não há nenhuma separação entre o nosso methodo e o nosso objecto. A unidade de nossa actividade é completa.
A discriminação entre o methodo e a materia é uma discriminação mental que nos auxilia a descobrir e estudar os differentes passos da experiencia. Methodo, assim, é a systematização de nossas observações e nossas conclusões com relação ao processo da experiencia, á sua montagem, ao modo como ella se arma. Quando essa distincção intellectual se applica, na pratica, como uma distincção existente e real, sobrevêm varios daquelles males que já apontamos.
Em primeiro logar, conduz a uma insensivel desattenção das situações concretas de experiencia, levando o educador a ordenar, autoritariamente e mechanicamente methodos uniformes para todas as crianças. Não levando em conta que só se apprende em uma occupação directa com as cousas, o pedagogo julga que apprender é um acto especial, com fim em si mesmo, e dahi todos os exercicio artificiaes e a rotina e a mecanicidade dos chamados methodos.
Mas isto não quer dizer que não exista um methodo de ensinar.
O auctor americano apenas salienta o engano de julgar-se que esse methodo é qualquer cousa concretamente existente e distincta, em realidade, de nossos actos. Como si houvesse um acto de ouvir, de ver, de imaginar, distincto de vêr, ouvir ou imaginar alguma cousa.
O methodo de ensino é o methodo de uma arte. E como o methodo de qualquer arte não é materia de inspiração improvisada, mas de estudo, de familiarização com uma technica, fructo de experiencias e da sciencia de mestres antigos. Ha instrumentos e ha materiaes que conhecer e que apprender a manejar. Mas, o commando e dominio dessa technica, não escraviza, nem uniformiza os methodos de ensinar. Como o pintor ou o artista em geral, o professor commanda essa technica e della se serve para usos individuaes, originaes, pessoaes, adaptados a cada caso. Não esqueçamos uma distincção que julga util accentuar. A arte do professor é a arte de acompanhar e ordenar o acto de apprender em cada criança de accordo com os seus caracteristicos distinctivos.
Essa arte deve, assim, possuir uma technica mais plastica, mais flexivel, mais variavel do que a de qualquer outra arte. De facto, professor e discipulo é que trabalham. São dois artistas associados no mesmo emprehendimento.
Existe, assim, um methodo geral que compreende o conhecimento scientifico da criança e do processo do acto de ensino e seu material, e um methodo individua que é a applicação daquella technica geral ás capacidades nativas, aos habitos e interesses e preferencias do alumno.
Os elementos especificos desse methodo individual não são passiveis de discriminação. Variam como variam os individuos.
Dewey, entretanto, salienta certas attitudes centraes que se devem insistentemente procurar desenvolver no alumno com relação ao objecto de sua experiencia e de actividade.
É difficil resumir com perfeita exactidão o pensamento do philosopho americano. Parecem-me, entretanto, singularmente expressivas da propria psychologia actual do caracter americano essas attitudes que o educador busca desenvolver desde os exercícios e as actividades da escola. Por ellas se percebe essa unidade do caracter anglo-saxonico, em que intelligencia e vontade obedecem aos mesmos principios e têm a mesma integridade.
I. A primeira attitude do alumno para com o seu objecto na escola deve ser a de rectidão. Isto é uma attitude simples e directa do individuo diante da experiencia. Ausencia de presumpção, embaraço ou constrangimento. Confiança, fé espontanea nas possibilidades das cousas, naturalidade. Pode esclarecer a comprehensão desse requisito a comparação, por ex., entre a attitude natural de uma criança que nunca foi á escola e algumas que a escola já tornou suspeitosas, escabriadas, indecisas.
II. Depois a criança deve sistentar uma attitude mental aberta, que francamente agasalhe suggestões. Deve -se tanto quanto possivel libertal-a de prejuízos ou preconceitos e estimular uma generosa hospitalidade intellectual para novas idéas, novos modos de encarar as cousas, etc. O desejo de uniformidade e a exigencia de resultados standardizados são impecilhos dessa qualidade mental.
III. Unidade de attenção. Não somente aquella naturalidade e aquella confiança que salientamos, no principio, mas unidade de interesse, integridade de mente, sinceridade, unidade de proposito. Essa attitude oppõe-se á duplicidade ou á falta de interesse completo demasiadamente communs nas escolas, sobretudo quando são denominadas pela idéa de preparação para o futuro, futuro que é sempre remoto e abstracto.
IV. Responsabilidade, isto é, acceitação do acto e de suas consequencias. Oppõe-se á indifferença, a essa attitude de pouco se importar com os resultados.
Muito brevemente indiquei as principaes attitudes que a educação americana julga indispensavel suggerir ás crianças na escola. A despeito da brevidade, ellas permitem, julgo, medir a extensão da formação de carater que provê similhante processo educativo.
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