Insisto neste ponto não só para mostrar a importancia que os educadores americanos dão ao ambiente material em que a sua juventude se forma, como, especialmente, para salientar um aspecto seu que é demasiadamente esquecido entre nós: o de que a educação não é somente o periodo arduo e desagradavel de preparaçao para a vida, mas é elle mesmo vida, devendo assim participar plenamente das condições actuaes de existencia.
   Qual será o brasileiro, sobretudo si foi alguma vez interno em um collegio, que não se lembrará do ambiente estreito dos seus dormitorios e refeitorios, da aridez da sua vida social, da sua supercongestão de trabalho puramente intellectual, em classes de pobres e estereis, e das fugas indefectiveis, ora para as seducções da leitura de romances e uma vida litteraria artificial, ora para a insubordinação e o constante descontentamento? Os melhores de entre nós terão sentido pelo menos o incompleto, o super-intellectual dessa vida exclusiva de estudos, em que o contraste entre uma rica e variada vida de leituras e a monotonia desgostosa da vida quotidiana, punha sempre a nota intima de inquitação e de tragedia, pela qual se caracteriza essa vida desintegrada de collegio.
   Dahi as aberrações de uma constante crise metaphysica muito caracteristica de nossa mocidade, que não leva do collegio esse contente idealismo americano, mas apenas o gravame de philosophias amargas, com um sentido inquieto da vida, e effectivamente diminuida e desestimulada para a lucta natural da existencia.
   Valha-nos que, hoje, um certo enriquecimento dos programmas com educação physica e esportes está a offerecer condições que ainda são sensivelmente mediocres, mas que já são superiores ás do meu tempo.

   Methodos de ensino

   No meu primeiro dia de visita, visitei duas aulas, uma de educação, outra de inglês, no curso especial de leitura (reading course).
   A aula de educação, uma aula do primeiro anno, consistiu na leitura e discussão dos relatos feitos pelas alumnas de um periodo anterior de observação em uma das escolas de praticas.
   A professora dirige a sua hora de aula no intuito de levar as suas alumnas a um julgamento positivo e proveitoso do trabalho das collegas. Cada uma das alumnas lia a sua descripção do trabalho observado e dos pontos que lhes haviam parecido capitaes. A classe, a seguir, discutia o valôr desses pontos e a contribuição individual da alumna.
   Essa discussão era uma fonte vital para varios ensinamentos de processos de methodos de exactidão e de estudo original. Em uma classe que estava apenas com um mês de trabalho, havia uma certa incerteza e falta de vigôr, mas o que desejo accentuar e o systema de collaboração e não de simples audição da classe.
   Para illustrar quanto esse processo de trabalho actual em classe está penetrando o espirito de methodo escolar americano, abro aqui um parenthese para contar uma anedota que me referiu um professor na Columbia University.
   Não sei que professor de educação teve que residir durante alguns meses em uma pequena localidade, afim de fazer um inquerito escolar. Durante esse periodo desejou pôr o seu pequeno de 6 para 7 annos em uma das escolas locaes. A criança esteve na escola um dia e não quiz mais voltar.
   - Porque não quer você ir á escola?
   - Oh! Papae! É uma escola só para ouvir ... ( a listening school).
   E já que estou a contar essa anedota, não resisto ao desejo de mencionar outro incidente, de outra natureza, mas tambem caracteristico não sei si diga da liberdade ou si da naturalidade e iniciativa da criança americana. Deu-se o facto na classe a que estava assistindo.
   A professora se esquecera, em seu quarto, de umas notas e pediu a uma alumna que lhe fizesse o favôr de ir buscar-lh'as. Depois de alguma demora, voltou sem as notas, informando com toda a naturalidade:
   - A senhora deixou a porta fechada; procurei saltar a janella, mas era era muito alta e não o consegui.


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