SILVA, Dom Augusto da (Cardeal). Carta a Anísio Teixeira, Bahia, 23 jul. 1957.
Localização do documento: FGV/CPDOC - Arquivo Anísio Teixeira - ATc 57.07.23.

Bahia, 23 de julho de 1957

Meu caríssimo Dr. Anísio 

Foi dolorosa surpresa a leitura do artigo "A bolchevisação do ensino", principalmente por vê-la sob o título de "Vida Católica".
A mágoa que, de justiça lhe causou aquela publicação, feriu-me, ao mesmo tempo, profundamente; conheço bem seu coração e suas idéias. Se ao menos se refutasse, calmamente alguma idéia sua, alguma daquelas que discordam do pensamento genuinamente católico, ainda bem, mas tripudiar sobre um nome reconhecidamente admirado, é realmente estulto, gravemente injusto, e mais ainda contrapoducente.
Sei que o meu boníssimo amigo de todos estes trinta e dois anos, de nossa amizade, tem abraçado algumas doutrinas menos cristãs, ou pelo menos, menos católicas, que conseqüentemente, logicamente, o tem afastado das santas práticas religiosas, mas, daí para "xingar" exclusivamente, vai um abismo. Esta a razão que me fez sofrer duplamente - a sem razão da ofensa e também a leviandade do ofensor, por ser este quem é. Particularmente chamarei a atenção dele; e a você, meu bom e querido amigo, trago-lhe minha reparação à mágoa que lhe foi irrogada pelo redator da "vida católica".
E já agora que sua amizade e confiança me derramou no peito amigo a justa e dolorosa queixa, quero, ainda uma vez dizer-lhe, que quero sempre ser seu amigo, e que realmente sofro em o ver sofrer tais injustiças.
Há, porém, meu caro Anísio, erros profundos em seu iluminado espírito!!! Bem sabe que a muita luz cega muito mais do que as trevas. Não foi o espírito da luz, quem primeiro errou?
Permita-me a confidência amiga. Li algumas páginas de um de seus livros, valioso presente, que agradeço muito penhoradamente, e pareceu-me descobrir indiretas pejorativas à idade média, a dos maiores gênios e a dos maiores santos. Sua apaixonada "idolatria" pela ciência e pelas belas letras, levou-o a prestar culto indevido ao Monteiro Lobato, cuja doutrina é atrevidamente demolidora da fé católica. O livro de M. Brasil, tirando as farpas com que o "ilustrou irrespondível. E o meu amigo, pôs os olhos somente na ciência e na literatura de M. Lobato, pois não?
Mas não quero tratar disso. Quero apenas levar-lhe minha solidariedade, na mágoa que lhe causou a "falta de assunto" para o jornalista incipiente e apressado.

Sempre seu

    1. Augusto Cardeal da Silva