CORREIO DA MANHÃ. Trabalhar pela escola pública não é propor política da escola única. Correio da Manhã. Rio de Janeiro, 16 abr. 1958.
Localização do documento: Fundação Getúlio Vargas/CPDOC - Arquivo Anísio Teixeira - ATj61

"Trabalhar pela escola pública não é propor política da escola única"

Afirmam em memorial ao prof. Anísio Teixeira, dezessete professôres da Universidade de São Paulo - "Não só a iniciativa particular, como a de tôdas as três ordens do govêrno serão mobilizadas para o grande esfôrço comum", diz o parecer daquele educador sôbre o projeto de lei de Diretrizes e Bases da Ensino Nacional

Avolumam-se as manifestações de solidariedade que o prof. Anísio Teixeira, diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos vem recebendo, em conseqüência das "hostilidades com que se procura ferir o homem que tantos e tão grandes benefícios vem prestando à educação nacional, cuja vida tem sido dedicada quase exclusivamente à causa do ensino". Agora, protestando contra as acusações contidas no manifesto dos bispos do Rio Grande do Sul, dezessete professôres da Universidade de São Paulo enviaram ontem ao prof. Anísio Teixeira, memorial, cujo texto transcrevemos:

O MEMORIAL

- "Temos o prazer e a honra de dirigir-nos, neste momento, ao brasileiro eminente que, a despeito de apresentar uma das mais notaveis folhas de serviços à nação, está mais uma vez sob a ameaça de ser desalojado de suas altas funções na administração federal. As hostilidades com que agora se procura ferir V. Excia., têm as mesmas origens e são fortemente marcadas pela mesma incompreensão e grave injustiça das que sofreu em outros tempos. Mas nunca suas idéias e asserções, na luta sem desfalecimentos pela causa da educação nacional de que V. Excia. é um servidor "sem medo e sem marcha", foram tão mal interpretadas e tão desvirtuadas.

A defesa que vem sustentando, da escola pública, não importou jamais em negar o direito e em subestimar o alcance das iniciativas privadas, leigas ou confessionais, dos domínios da educação. É essse um ponto em que V. Excia. tem insistido por tal forma que espanta ainda possa estar sujeito a interpretações equivocas e a lamentáveis deformações. Afirmar a importancia crescente da escola pública, trabalhar por ela e realçar-lhe o valor social, não é de forma alguma propor a política da "escola única", mas constatar fato de uma evidência que salta aos olhos de todos. Pois a história do ensino, nos tempos modernos, como um de nós já teve ocasião de observar, é a historia de sua conversão em serviço público.

Protestando contra esse movimento sectário que visa arrancar à administração um dos maiores educadores do país - idealista impenitente e de extraordinário espírito público, pedimos a V. Excia. aceitar a expressão muito cordial de nossa irrestrita solidariedade. Se todos os que têm contacto com V. Excia. são unanimes em reconhecer, desejamos ser dos primeiros a proclamar publicamente a honestidade e elevação e propósitos, a pureza de ideais republicanos, a dedicação incomparável ao serviço público e a capacidade excepcional com que V.Excia. tem abordado e procurado resolver ou pôr em via de solução os problemas mais urgentes da Educação no Brasil. Com os protestos de nossa profunda admiração e de nosso mais alto apreço. São Paulo, 14 de abril de 1958. a.) Fernando de Azevedo, Lourival Gomes Machado, Florestan Fernandes, J. Cruz Costa, Egon Schaden, Fernando Henrique Cardoso, Marialice Foracchi, Gilda de Mello e Souza, Antonio Candido de Mello e Souza, Octávio Janui, Paula Beiguelman, Gioconda Mussolini, Lívio Teixeira, Maria Isaura Pereira Queiroz, Renato Jardim Moreira, Dante Moreira Leite e Joel Martins".

"EU NADA SEI…"

A propósito dos rumores de que o prof. Anísio Teixeira seria exonerado do cargo de diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, em conseqüência do Manifesto dos Bispos gaúchos, nossa reportagem ouviu aquele educador, que, admirado com nossa pergunta, disse, apenas: - "Eu nada sei sôbre isso".

ACUSAÇÕES INFUNDADAS

Falando à reportagem do Correio sôbre as acusações existentes no manifesto, o prof. Anísio Teixeira citou trechos do livro "A Educação e a crise brasileira", onde diz: "Jamais deixei de reconhecer, apesar da extrema severidade com que julgo os nossos padrões escolares, o que há de esplêndido vigor nesa nossa expansão educacional recente e em curso. O interêsse e a comovente paixão com que Municípios, Estados e particulares estão a construir prédios, improvisar professôres e fundar escolas de tôdo gênero, são, sem dúvida, dignos de amparo e estímulo, a par de diligentes esforços de orientação, sem partipris, sem imposições oferecida e livre, compreensivamente aceita, a bem do melhor e do mais promissor em progressividade. Possamos nós descobrir os modos e meios de coordenar tôdas essas energias e canalizá-las para um grande e patriótico, planejado e vigoroso".

PARECER DA LEI DE DIRETRIZES E BASES

Ainda para mostrar que as acusações feitas no Manifesto dos Bispos não têm fundamento, mostrou-nos o prof. Anísio, seu parecer sôbre a Lei de Diretrizes e Bases, quando foi, juntamente com os dois outros educadores, solicitado a colaborar na reconstituição daquele projeto.

É o seguinte: - "As grandes linhas desta lei assim se poderiam resumir: Unidade da educação brasileira - Tôda a educação brasileira, em todos os seus níveis e ramos, terá diretrizes e bases comuns, constituindo um sistema contínuo, diversificado e uno, a ser executado por particulares e pelos podêres públicos, sob a administração dos Estados e a supervisão discreta, mas eficaz, do govêrno federal. Não só a iniciativa particular, como a de tôdas as três ordens de govêrno, serão mobilizadas para o grande esfôrço comum, em um regime de livre participação e de responsabilidade, sem imposição de modêlos rígidos e uniformes, mas em sadia emulação, em que ao lado do bom se erga o melhor e um outro mutuamente se fertilizem, para o progresso e a vitalidade contínua do ensino".

 

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