MATTOS, Florisvaldo. Sopro de modernidade. A Tarde. Salvador, 12 ago. 1995.

SOPRO DE MODERNIDADE

"Estadista da educação" foi como outro grande baiano, Hermes Lima, definiu Anísio Teixeira por ser ele quem oferecera a maior contribuição de educador ao Brasil. Afrânio Coutinho não fez por menos, ao classificá-lo de "inteligência das mais fecundantes, lúcidas e profundas", e sustenta que Anísio Teixeira pelos livros que escreveu e pelo que realizou em todos os cargos por que passou (diretor de Instrução, secretário de Educação, diretorias do INEP e do MEC, membro do Conselho de Educação Superior da UNESCO, reitor da Universidade de Brasília) deu provas de como reunir o pensamento e a ação na área educacional".

O artigo de Darci Ribeiro, outro grande da educação no Brasil, aqui reproduzido, chega no momento em que se tem a impressão de estar o nome de Anísio Teixeira meio esquecido, apesar de existir na Bahia uma fundação em sua homenagem, e tem o mérito de ressaltar a dimensão universal de sua personalidade, o valor de suas idéias para a democracia, o brilhantismo e eficácia de sua inteligência. Fala do que foi ele para o Brasil, mas quase omite ou desconhece o tamanho da importância que foi a passagem de Anísio Teixeira pelo cargo de secretário da Educação da Bahia, no governo de Octávio Mangabeira (1947-1951).

Foi Mangabeira quem o trouxe da UNESCO para a Secretaria de Educação e Saúde do Estado. E seria justamente ele quem abriria as portas da modernidade para a Bahia, criando as condições de política e abertura culturais para a verdadeira implantação da estética modernista no estado e incentivando as realizações da nova geração de artistas e escritores (Carybé, Mário Cravo Júnior, Rubem Valentim, Genaro de Carvalho, Jenner Augusto, Vasconcelos Maia, José Pedreira, Lygia Sampaio, Carlos Bastos, Wilson Rocha, dentre muitos). Os ventos da atualidade política e cultural que sopravam da Secretaria da Educação, com Anísio Teixeira designando uma equipe jovem para os postos de mando e para o comando de projetos que traziam a cara e a força das idéias novas, impulsionavam o movimento cultural, incutiam entusiasmo, despertavam aspirações cosmopolitas, deflagravam um processo de renascimento cultural, já que as coisas se haviam parado por aqui desde que se esgotaram as energias e a agitação de presença que marcavam a ação dos membros da academia dos rebeldes, nos começos dos anos 30.

O clima de democracia, de humanismo e valorização da inteligência artística, que se instaurara iria possibilitar o desafogo das relações culturais, promovendo a articulação de artes e letras com as instituições culturais e políticas; adubou de cosmopolitismo o estado de espírito reinante no pós-guerra. E havia um dado a mais neste quadrante liberal: estava surgindo a Universidade da Bahia que, nos anos 50 e 60, iria transformar-se na grande usina de produção de difusão de cultura. Novos horizontes se abriram, efetivamente. Foi então possível a promoção de atividades decisivos no campo cultural, como as exposições de artes plásticas, a partir da que foi trazida pelo escritor carioca Marques Rebelo, em 1948, para Salvador, permitindo que se quebrasse o gelo do ambiente conservador preexistente.

O modernismo enfim chegara à Bahia. Sucederam-se as exposições de jovens artistas locais; surge a Galeria Oxumaré no Passeio Público; o ambiente literário era sacutido por uma importante publicação de imprensa cultural, associada ao trabalho da nova geração de artistas plásticos - a revista Caderno da Bahia. E até a boemia artística teve seu espaço: o famoso bar Anjo Azul, no Cabeça, decorado principalmente por Carlos Bastos (painel de entrada e quadros) e Mário Cravo Júnior (esculturas) e dirigido por Vasconcelos Maia e José Pedreira, dois contistas.

Tudo isso - e mais - só foi possível porque estava sentado na cadeira de secretário da Educação do Estado um intelectual da estirpe de Anísio Teixeira, com cuja a personalidade só uma palavra rimava: modernidade. Nascido em Caetité em 12 de julho de 1900, exatamente há um mês teria completado 95 anos. Morreu em circunstâncias trágicas (e, para a época, também misteriosas) no Rio de Janeiro em 11 de março de 1971. Lembrá-lo é preciso.

(Florisvaldo Mattos, editor)

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