A NOTÍCIA. As escolas brasileiras são fábricas de diplomas. A Notícia. Rio de Janeiro, 24 abr. 1959.

As escolas brasileiras são fábricas de diplomas

Incisivo pronunciamento do professor Anísio Teixeira no debate ontem realizado sôbre Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Domínio das mediocridades – Condenação unânime ao substitutivo apresentado ao Congresso Nacional

<<Desde o tempo de D. João VI que se elaboram planos de educação, neste país. São 12, ao todo. O único, porém, destacado como exeqüível, arrasta-se há 11 anos pelo Congresso Nacional, pràticamente sem solução. Agora, com o magnífico substitutivo do sr. Clóvis Salgado ao projeto de Diretrizes e Bases, preconizando o ensino primário, de contrôle regional, e os demais, de orientação nacional, que poderia ser aprovado de imediato, com esplêndidos resultados para a mocidade estudantil brasileira, vem o mesmo de ser tumultuado por outro dispositivo, de origem duvidosa, cujo objetivo é sacrificar o povo em benefício de gananciosos proprietários de colégios>> – declarou o prof. Raul Bittencourt, da tribuna da Faculdade Nacional de Filosofia, durante a mesa-redonda sôbre <<Diretrizes e Bases da Educação Nacional>>, presentes o ministro da Educação, prof. Anísio Teixeira, deputado Rui Ramos e muitos outros professôres e parlamentares.

DEBATES

Depois do prof. Raul Bittencourt apelar para o deputado Rui Ramos, no sentido de atentar para a gravidade do assunto, quando o projeto tramitar em definitivo pela Câmara, e de receber a resposta de que <<além do apêlo do educador, recebo a ordem do meu antigo mestre>>, iniciaram-se os debates, dizendo o Sr. Anísio Teixeira: <<As nossas escolas são fábricas de diplomas, distribuídos à base de propinas, a uma mocidade inculta. Raro é aquêle que se destaca na vida pública, em conseqüência do seu saber. Daí a necessidade urgente e inadiável de reestruturarmos o ensino nacional, em bases amplas, profundas e, sobretudo, honestas. Desgraçadamente, o substitutivo Carlos Lacerda mistura, de propósito, liberdade educacional com o fato de ser a educação privada ou pública. Entretanto, de liberdade êle só tem a máscara, pois o que realmente pretende é entregar a educação aos proprietários particulares, transmudados em pedagogos, por um passe de mágica. O <<negócio>> de Lacerda não se refere aos pais de alunos, e sim aos cofres do país. Tiram-se 25 milhões do Govêrno, em nome da família brasileira, para entregá-los aos mandatários fantasmas dessa mesma coletividade, na tentativa de transformar o Brasil em uma República Privada>>.

Logo após o professor Jaime Abreu declarar que <<os pobres ficarão sem escolas, se fôr aprovado o substitutivo Lacerda>>, e do dr. Almir de Castro afirmar que <<o substitutivo Lacerda é uma fábrica de diplomas e uma guitarra de dinheiro>>, salientou o prof. Darci Ribeiro: <<Só a escola pública é democrática. No entanto, Lacerda pretende acabar com ela, a pretexto de uma falsa defesa da família brasileira. O substitutivo visa tirar ao povo o direito de orientar a educação dos seus filhos transferindo-a para o tubaronato escolar, já tão conhecido do nosso público.

CARÁTER POLÍTICO

Segundo a opinião geral, o substitutivo Lacerda é obra de um grupo de interessados na sua aprovação, destacando-se os proprietários de escolas, uma vez que os 25 bilhões de cruzeiros, despendidos anualmente pelo Govêrno, seriam transferidos para os bolsos dos monopolizadores. Daí as sete acusações principais: falsos interêsses religioso e conservador; dúbio conceito de liberdade; dinheiro público para particulares, equívoco, má inspiração ou <<coisa pior>>. Além disso, destaca-se a pretensão de <<salvaguardar interêsses ideológicos, tanto mais tristes quanto menos lúcidos>>.

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