ÚLTIMA HORA. Educadores: é retrógrado o substitutivo-Lacerda. Última Hora. Rio de Janeiro, 25 abr. 1959.

EDUCADORES: É retrógrado o Substitutivo-Lacerda

Quatro dos mais renomados educadores brasileiro – Anísio Teixeira, Darcy Ribeiro, Raul Bittencourt e Jayme de Abreu – numa mesa-redonda realizada na Faculdade Nacional de Filosofia, sob a presidência do Ministro Clóvis Salgado, e sob vivos aplausos de uma assistência de mais de duzentas pessoas, repeliram, violentamente, durante três horas e meia, o substitutivo Lacerda, de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional, denominando-o de retrógrado e nefasto aos interêsses do povo brasileiro.

– A educação só será livre quando fôr libertada dos dogmas, das tradições cegas e dos interêsses de grupos. O que temos hoje, é uma ficção educacional. A legislação do ensino atual é capciosa e satisfaz, apenas, ao aluno e ao professor, nunca à própria educação. Não é através de títulos que uma Nação se desenvolve, e sim pelo saber. A escola, como dizia o Deputado Carlos Lacerda, não é o prolongamento da educação em família, mas a busca de um benefício assegurado pelo Estado – declarou, a certa altura dos debates, o Professor Anísio Teixeira, argumentando contra o Substitutivo Lacerda.

12 PROJETOS

Iniciando a mesa-redonda, falou o Prof. Raul Bittencourt, relator da matéria, fazendo uma longa exposição sôbre todos os planos e projetos já elaborados sôbre Diretrizes e Bases para a Educação, que são em número de 12, sendo que o primeiro data da época de D. João VI. Em seu parecer final, disse êsse educador:

– Não tenho dúvidas de que o Substitutivo do Ministério da Educação e Cultura se aproxima em muito às verdadeiras necessidades da educação nacional. É impossível, para nós homens, realizarmos algo perfeito; entretanto, em se comparando o Substitutivo do MEC e o apresentado pelo Deputado Carlos Lacerda, não titubeio um instante sequer, após os estudos que realizei, em proclamar o primeiro como o mais acertado e mais coerente, livre de dogmas e de doutrinas, essencialmente estruturado nas bases e com diretrizes realmente orientadoras.

ANÍSIO

Defendendo ardorosamente o Substitutivo do Ministério da Educação, afirmou, a seguir, o Prof. Anísio Teixeira, um dos debatedores da mesa-redonda em comemoração ao 20º aniversário da Faculdade Nacional de Filosofia; abordando a liberdade de educação e a educação privada.

-– A escola pública é mais livre que a particular, pois, esta satisfaz a interêsses do próprio estabelecimento enquanto que a primeira é demasiadamente revolucionária e sempre gozou de grande liberdade. Com o Substitutivo do MEC, o Brasil sairá da camisa-de-fôrça em que se encontra envolvido para marchar para as soluções dos problemas educacionais.

DARCY RIBEIRO

– Se aprovado, o Substitutivo Lacerda, será a medida mais retrógrada já tomada pelo Parlamento Nacional. Resultaria no estrangulamento total do desenvolvimento nacional. Se o Brasil sofresse o impacto pela aprovação de tal Substitutivo, seria a calamidade pública. O Substitutivo Lacerda caracteriza-se por ser uma agressão frontal à escola pública. E a hostilidade é de tal ordem que, num dos seus artigos, há a determinação de que só haverá escola pública, quando não puder haver uma particular – disse, inicialmente, o Professor Darcy Ribeiro. E acrescentou incisivo:

– Em nome de que liberdade, de que princípios, declara-se que a escola pública não tem capacidade de educar? Qual a escola mais capaz de atender à família brasileira, sem distinção de côr, ideologia ou religião? O que se discute é o rateio das verbas públicas! O que se discute é se o povo brasileiro deve multiplicar o Pedro II ou financiar as escolas particulares. Não queremos dar liberdade para as escolas darem diplomas, e sim para darem educação ao povo brasileiro. Todo pai está ciente da deficiência gritante do ensino secundário e qualquer pessoa, com os mínimos conhecimentos de História Contemporânea ou de Ciências Sociais, verifica a mentira da alegação de que a escola pública é ineficaz – concluiu.

JAYME ABREU

O Prof. Jayme de Abreu, por seu turno, condenou, veemente, o Substitutivo, chamando-o de insuficiente e doutrinário, conseqüentemente, nocivo aos interêsses do povo. Referindo-se ao financiamento propugnado no Substitutivo Lacerda aos estabelecimentos particulares, acentuou aquêle famoso educador:

– É inadmissível que uma escola pública só possa florescer, quando, absolutamente, não haja particulares interessados em fundar uma escola. Outro absurdo é o financiamento de quase 10 por cento do Orçamento Geral da República para as escolas particulares. As escolas públicas, para o Sr. Carlos Lacerda, são simplesmente hostis ao povo brasileiro, porque fornecem ensino gratuito e melhor aos alunos.

MINISTRO

Após o debate, o Ministro da Educação, Sr. Clóvis Salgado, fêz diversas considerações sôbre o Substitutivo do seu Ministério, tecendo esclarecimento sôbre a matéria e comparando-a com o Substitutivo Lacerda.

Compareceram, ainda, à mesa-redonda o Deputado Federal Rui Ramos e o Dr. Heli Menegalle, Diretor do Departamento Nacional de Educação.

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