DIÁRIO DE NOTÍCIAS. O destino da escola pública é formar a consciência da nação. Diário de Notícias. Rio de Janeiro, 24 abr. 1960.

DIRETRIZES E BASES

O DESTINO DA ESCOLA PÚBLICA É FORMAR A CONSCIÊNCIA DA NAÇÃO

ESDE que se organizou a sociedade política e civil, independente das Igrejas, fêz-se indispensável fundamento leigo para as obrigações morais do homem. A escola pública é, por excelência, a formadora dessa moralidade fundada em bases leigas e comuns para tôda a sociedade>> - afirma o professor Anísio Teixeira.

Esclarece o educador que as monarquias européias, mantendo ainda união com certa Igrejas, têm-se visto na contingência de dar às demais Igrejas que não as oficiais, idênticos direitos e garantias aos das Igrejas <<estabelecidas>>... A República, porém, não pode imitá-las. Na República, o comportamento humano tem bases leigas e seculares e estas bases são as inculcadas pela escola pública...

ESCOLA NEUTRA

<<A educação privada - prossegue - representa tôda uma outra sorte de interêsse, que o Estado tolera ou permite, mas não pode nem subvencionar nem promover. A tolerância, a permissão, a liberdade, enfim, do ensino privado é mais um princípio da ideologia do estado moderno, que recusa impor a todos a sua própria ideologia, mas jamais pode chegar a promover as ideologias a êle opostas.

Na luta contra as ideologias religiosas e por amor ao princípio de tolerância, o Estado deu excessiva ênfase ao que chamou de sua <<neutralidade>>. Essa neutralidade nada mais significa do que a neutralidade entre crenças religiosas. Jamais o Estado se julgou neutro ante as crenças morais do homem. O Estado funda-se numa moralidade secular, leiga, pela qual julga o homem responsável, sujeito de direitos e deveres. Essa moralidade mais geral que a religiosa, por isso mesmo que comum a todos, sejam lá quais forem as crenças de cada um, quem a promove, a ensina, a inculca, senão a escola pública?

Temos, assim, que a escola pública>> não é apenas a escola para o pobre, no que resultaria, se fôsse apenas uma extensão da escola privada às classes menos favorecidas, mas a escola destinada a fundar a república e a reforma a consciência nacional>>.

ESCOLA PÚBLICA

- Por isto mesmo, a escola pública é a instituição que acompanha mais de perto o próprio desenvolvimento da nação. Nacionalismo e escola pública são têrmos correlatos. Um não existe sem a outra. E aí está a segunda razão da escola pública. Ela é escola nacional, destinada a formar a consciência da nação, do mesmo modo que é a escola destinada a promover a igualdade social, a igualdade de oportunidades.

Faz-se, hoje, grande silêncio sôbre as relações entre o Estado e as igrejas, dando como óbvias certas doutrinas no mínimo absolutamente superadas.

IMPLICAÇÕES SOCIAIS

- Até agora, o Estado brasileiro vem mantendo com graves deficiências o ensino primário obrigatório e resistindo à ampliação oficial da rêde de ensino secundário. No ensino pós-primário, o Estado dá preferência ao ensino especial, técnico, profissional ou normal.

Em sociedade de tipo competitivo como o das sociedades ocidentais, e que é também o nosso, o que se busca acima de tudo não é uma boa educação, mas educação melhor que a dos outros, diz, com muito acêrto Bertrand Russel. Outra coisa não sucede, com efeito, no Brasil. Por uma razão ou por outra, considera-se melhor educação a da escola secundária acadêmica. Por isto mesmo, esta era a educação que se podia custear a si mesma.

Como muitos a desejavam, foi possível à iniciativa particular provê-la. Puramente acadêmica, ou seja na concepção corrente entre nós de acadêmico, puramente verbalística, êste tipo de educação era barato e podia ser ministrado cobrando anuidades escandalosamente módicas, no que ajudava o surgimento de um magistério privado improvisado e sem consciência profissional nem reivindicações sérias de salários.

Por êste fato, a clientela da escola privada pode ampliar-se muito além daquela camada que, suficientemente rica, em tôdas as sociedades do tipo da nossa, mantém o ensino particular. Ora, é essa ampliada clientela de uma classe média recém-expandida que não se vê hoje, em condições de continuar a custear a educação privada dos seus filhos, por motivos perfeitamente enumeráveis, ou seja, o da subida geral dos preços e das reivindicações salariais dos professôres, que, lentamente, se foram organizando em classe profissional, já por um progresso natural, já como resultado de sua formação nas faculdades de filosofia.

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