TEIXEIRA, Anísio. Desbaratados os recursos públicos para a educação. O Globo. Rio de Janeiro, 24 abr. 1958.

Desbaratados os Recursos

Públicos Para a Educação

Significativo Depoimento do Sr. Anísio Teixeira - Sete Milhões de Crianças Sem Escolas - "Frustrados Mentalmente e Incapacitados Para se Integrarem em Uma Civilização Industrial" - Mostra-se Escandalizado o Diretor do INEP

EM FACE de Memorial dado a conhecer pelos Bispos do Rio Grande do Sul, o Prof. Anísio Teixeira, do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, prestou a O GLOBO esclarecimentos, em que situa a sua orientação quanto aos problemas educacionais, bem assim, referente à sua atuação naquele órgão.

Razões do Educador

Manifesta-se o Sr. Anísio Teixeira, notadamente, contrário à educação "como processo exclusivo de formação de uma elite", o que, a seu ver, mantém a grande maioria da população em estado de analfabetismo e ignorância. A seguir, confessa sua revolta por saber que metade da população brasileira não sabe ler e que, nesse momento, mais de 7 milhões de crianças, entre 7 e 14 anos, não têm escolas", frisando, ainda, que, dos 5 milhões que freqüentam educandários, apenas 450.000 conseguem chegar à quarta série, "todos os demais ficando frustrados mentalmente e incapacitados para se integrarem em uma civilização industrial e alcançar um padrão de vida de simples decência humana". Mostra-se ainda o educador contristado por verificar "a falta de consciência pública para situação tão fundamente grave na formação nacional e o desembaraço com que os podêres públicos menosprezam a instituição básica da educação do povo, que é a escola primária". Lamenta o senhor Anísio Teixeira, por outro lado, a desvinculação do ensino médio das exigências da vida comum de uma nação moderna e "o seu caráter confuso e enciclopédico de falsa formação acadêmica".

Conclusões Desanimadoras

- Revolta-me ver que, de tôda essa esplêndida juventude, menos de 5% chegam aos umbrais da universidade, frustrando-se os sacrifícios de centenas de milhares de famílias - acentua o educador, tecendo, ainda, considerações sôbre o assunto.

Confessa-se o Sr. Anísio Teixeira chocado ao ver "o desbarato dos recursos públicos para educação dispersados em subvenções de tôda natureza e atividades educacionais, sem nexo nem ordem, puramente paternalistas ou francamente eleitoreiras, dizendo-se, mais, escandalizado por ver que, numa população de 60 milhões, apenas um milhão de pessoas tenha ensino secundário completo, 160 mil consigam alcançar nível superior, e haja, apenas, 20 mil vagas para formação universitária, "o que constitui séria ameaça de colapso para o nosso desenvolvimento econômico e cultural".

Declara o Sr. Anísio Teixeira ser contrário à dispersão de esforços no ensino superior, pela multiplicação de escolas improvisadas em vez da expansão e fortalecimento dos bons educandários.

Educação Para o Desenvolvimento

Fixa o diretor do INEP, concluindo, as diretrizes que julga acertadas no plano educacional, mostrando-se favorável ao período de 6 anos na formação primária, nas áreas urbanas, para quatro anos em zonas rurais. Quanto ao ensino médio, diz o Sr. Anísio Teixeira ser recomendável o nível alto, preparatório para a vida, ao invés de simplesmente propedêutico aos estudos anteriores, compreendendo currículo simples e objetivo.

A aplicação dos recursos deveria - a seu ver - obedecer a dois critérios básicos: assegurar ao povo um mínimo fundamental de educação gratuita, a escola primária, e sòmente custear com os recursos públicos a educação pós-primária, de alunos escolhidos em livre competição, abolindo-se privilégios. Manifesta-se, também, favorável a uma educação voltada para o desenvolvimento, "que realmente habilite a juventude brasileira à tomada de consciência do processo de autonomia nacional" e a capacite "para as tarefas materiais e morais do fortalecimento e construção da civilização brasileira".

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