DIÁRIO DE NOTÍCIAS. Corrigindo uma omissão: o projeto de diretrizes cria educação unificada. Diário de Notícias. Rio de Janeiro, 14 abr. 1960.

CORRIGINDO UMA OMISSÃO

O PROJETO DE DIRETRIZES

CRIA EDUCAÇÃO UNIFICADA

>>O ASPECTO mais característico do novo substitutivo à Lei de Diretrizes e Bases, em curso no Senado Federal, é a concessão de categoria ao ensino privado, parecendo que algo de incoercível compele o país a dar ao ensino privado as regalias e privilégios do público>> - declarou ao <<Diário de Notícias>>, o professor Anísio Teixeira, catedrático de Administração Escolar da Universidade do Brasil e diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos.

Observou que as origens dessa tendência mergulham em nosso passado colonial. Os primeiros donatários tinham o poder público, mas para gôzo e uso privado. Enquanto que na colonização inglêsa as sociedades colonizadoras, pouco a pouco, se faziam públicas, na colonização portuguêsa, as capitanias eram instituições públicas que pouco a pouco se faziam privadas. Com os inglêses, o privado tendia a se fazer público; com os portuguêses, o público tendia a se fazer privado.

E remata o prof. Anísio Teixeira: <<Guardamos o velho vinco, o velho hábito, a antiga mazela e eis que ressurge ela agora na lei básica da educação nacional. Vale a pena rápida reconstituição histórica, para marcar a forma com que a velha deformação nacional vem repontar no quadro o sistema público de educação brasileira>>.

INSTITUIÇÃO <<MODÊLO>>

Para o professor Anísio Teixeira, ainda não é desta vez que será definido, de modo perfeito, se sancionado o atual substitutivo, o sistema educacional brasileiro. Esqueceram-se os legisladores do papel relevante do Estado no campo da educação.

<<Todos sabemos - salienta - com que resistência o Estado, no Brasil, vem cumprindo a obrigação constitucional de ministrar a Educação. Na Monarquia, podemos dizer que não passamos da ação acidental de criar e manter alguns Institutos de Educação, com o caráter que se poderia chamar de <<exemplar>. Ao Estado, cabia a ação de estímulo, no máximo de organizar as instituições <<modêlo>>, <<padrão>>. Com a República, tivemos modesta exaltação da consciência pública e lançamos as bases de um sistema dual de educação: a escola primária e profissional para o povo, a escola secundária e superior para a elite. O primeiro constituiria o sistema público; o segundo, o privado, dado por concessão pública, mas para ser mantido por meio de recursos privados. Os que o quisessem, que lhe pagassem o custo. Com a integração do povo brasileiro e o desaparecimento progressivo da chamada elite, o sistema da escola secundária e superior a ela destinado vêm-se fazendo, cada vez mais, um sistema de massa, um sistema popular, tão do povo quanto o especialmente organizado para êle>>.

EDUCAÇÃO UNIFICADA

<<Durante essa manifesta evolução do sistema educacional brasileiro - observa a seguir - tudo levaria a crer que a tendência do Estado seria para esquecer o velho dualismo e lançar-se à manutenção de um sistema público de educação unificado. Daí desapareceria o caráter discriminatório anterior, passando o Estado a manter não só escolas primárias e profissionais mas também escolas secundárias e superiores. E isto é o que vinha sucedendo. São Paulo já possui um considerável número de escolas públicas secundárias>>. E acrescenta:

- Contra isto é que agora se levanta o projeto de Diretrizes e Bases, promovendo a oficialização dos colégios particulares e o reconhecimento do seu direito de participar dos órgãos de direção do ensino. À primeira vista, parece que a tendência é do particular se fazer público. Mas, se aprofundarmos a análise, vemos que o particular não é convocado a agir como público, mas, muito pelo contrário, é convocado a participar dos órgãos públicos, no caráter privado e para representar, dentro do público, o privado. Ora, isto é, exatamente, dar ao privado as regalias do público>>.

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