AZEVEDO, Fernando de. Carta a Anísio Teixeira, S. Paulo, 14 mar. 1932. Localização do documento: Fundação Getúlio Vargas/CPDOC - Arquivo Anísio Teixeira - ATc 31.12.27.

  1. Paulo, 14 de março de 1932.

Meu caro Anísio:

Entre as cartas que me esperavam, no escriptorio da Companhia, lá estava a sua, que devia ter recebido antes da minha partida para o Rio. Chegou, como vê, com atrazo. Fala-me V. , nessa carta, com uma bondade captivante, sobre a impressão que lhe deixa a directoria "esta casa que é sua", segundo as palavras do meu querido amigo. Eu o comprehendo. Não há nisto apenas um traço delicado de generosidade, muito de seu feitio. Os espiritos de escol, como o seu, têm a grandeza de alma que lhes permittem a riqueza de seu pensamento e a largueza de seus horizontes.
Mas, com aquella sua expressão amavel, V. registra tambem um facto, que eu tive a alegria de constatar. São os que trabalharam comigo, num convivio de longos anos, que cerram agora fileiras, em torno do seu novo chefe, dando a este, com a mesma lealdade e o mesmo enthusiasmo, as provas de dedicação com que conquistaram todos os direitos à minha confiança e à minha amizade. V. não imagina a satisfação que tive de ver, reunidos à volta do novo director, sob a mesma bandeira de renovação educacional, aquelles que não me faltaram um instante, nas alegrias das realizações, como nos sobressaltos das luctas e das provações. Elles provam com isto, mais uma vez que era a "communidade" de ideais e de aspirações a força mais poderosa que os ligava a mim, numa alliança que nem o tempo, nem a distancia, nem o desfavor das circunstancias, nem os revezes conseguiram dissolver.
Escrevo-lhe às pressas, com a cabeça pesada de somno. Incapaz de atar idéas. Estive, inutilmente, à espera do seu telephonema. O Nobrega tambem ficara de ligar o telephone, para casa, hoje à noite. Também elle faltou. Insisto sobre as assignaturas do Afrânio e do Carneiro Leão. Informe-me com urgencia sobre se elles nos deram a sua solidariedade, para eu mandar incluir, com tempo, os seus nomes entre os que assignaram o nosso manifesto. Escrevo ao Frota, hoje. É preciso que o nosso manifesto tenha a maior repercursão possível. Isto se conseguirá se, ao menos, os principaes jornais do Rio ( Jornal do Com., O Jornal, Jornal do Brasil e Diário de Noticias) e os de S. Paulo, o dérem, na integra, no mesmo dia. Não é pouco. Mas não é cousa difficil de obter. Se conseguirmos, além disso, que, no mesmo dia 19 (sabado) outros jornais o publiquem no Rio Grande, Paraná, Minas, Bahia e Pernambuco, teremos dado o primeiro grande passo para a sua repercursão. As copias entregues à imprensa deverão ser cuidadosamente revistas.
Quando falo nesse manifesto, já me esqueço de que fui eu quem o escreveu. Elle é obra impessoal. Havia de ter, como teve, um redactor. Mas nelle se inscreveram, em corpo de doutrina, "idéas e aspirações communs", que nos permittem, a mim como a cada um dos outros signatarios, falar delle "objectivamente". A bandeira não é de quem a teceu, mas de quem a honra e de quem a conquistou. De todos nós, portanto. A sua mão de chefe foi feita para a empunhadura dessa bandeira: nós estaremos para defendel-a em toda parte em que se realize obra à sua sombra e sob a sua inspiração. Escreva-me.
Telefone-me. E o projecto da Escola Normal? Estou prompto para a entrevista.

Do muito e sempre seu

Fernando

 

| Cartas de Anísio Teixeira | Cartas a Anísio Teixeira | Cartas entre terceiros |