CABRAL, Luiz Gonzaga. Carta a Anísio Teixeira, Salvador, 20 abr. 1921.
Localização do documento: Fundação Getúlio Vargas/CPDOC - Arquivo Anísio Teixeira - ATc - 18 01 26

                                                                                                                            *C.A.V., 20/4/1921

Meu Anisio

Só hoje, pelo Oswaldo, soube que o Anísio já partira para o Rio. Só hoje, pois, me é possível, escrever-lhe à vontade. A intimidade, aliás tão simpática, da família que considera bem comum a carta chegada, impossibilitava-me de responder à sua última, mandando a resposta para Caetité.
Que lhe direi, meu querido filho, da resolução tomada?
Em primeiro lugar, não estranho a dificuldade de Papai e Mamãe. Se o Anísio está lembrado, eu tinha-lhe prenunciado, sem ser profeta, o que passou seu bom irmão Nelson (cujo critério, até certo ponto, admiro ainda mais que no Anísio, pois a vocação é sua e não dele), seu bom irmão Nelson apreciou da maneira mais ilustradamente cristã, em carta que me escreveu, a oposição materna. Ditosos os que, desde os primeiros anos, tiveram a formação integral do catolicismo com a plenitude do espírito de N. S. no Evangelho!
E agora, qual a resolução a seu respeito? A minha primeira idéia - já noutra ocasião lho declarei - era que só partisse para o Santo Noviciado depois de terminada a sua formatura em Direito. Parece que permitiu N. S. se dispusessem as coisas para assim se realizar. No entretanto, quanto é da sua parte, o desejo de obedecer ao chamamento de Deus, ainda que lhe faltem entusiasmos sensíveis, deve ser generoso e pronto, quanto à disposição da vontade, para seguir logo que cessem os embaraços. Essa complacência secreta que parece regozijar-se com a demora, deve ser combatida, na certeza de que, como em todas as mais tentações, não está o mal em sentir, mas em consentir!
Coragem pois, meu Anísio! Considere-se desde já como um religioso forçado a viver entre mundanos; santifique-se cada vez mais, faça em volta de si todo o bem que possa; avive com atos cada vez mais freqüentes e intensos o desejo de deixar o mundo, e confie que as dificuldades de seus pais, o Pai do Céu pode resolvê-las de um momento para o outro: talvez o que oralmente não conseguiu em Caetité, poderá consegui-lo por escrito desde o Rio.
Anísio há de estar espavorido da minha letra. Explicação: quase não escrevo uma palavra que não adormeça. Estou cansadíssimo!
Que pena eu tenho que o trem, Anísio, não tenha que passar pela Bahia no seu regresso!
Já aqui encontraria José Martins que também experimentou dificuldades do Pai e vai cursar este ano a Escola Politécnica. Cá poderia falar também com Thomás e Chico.
Guilherme e Monteiro devem partir para a Europa no paquete de 6 ou 12 de maio! Devem estar a chegar à Bahia.
A nossa Congregação anuncia-se muito prometedora.
Tivemos domingo a festa da posse das dignidades. Foi a festa mais esplendorosa que até hoje celebramos. Houve missa cantada; e estreou-se ao Evangelho o novo púlpito, pregando o seu Cabral o panegírico de S. José. Estiveram 12 lentes e 56 Congregados.
Aguardo sua carta e fica-lhe intimamente reunido nos corações de Jesus e de Maria.
O seu dedicado amigo

    1. Luiz Gonzaga Cabral

*Colégio Antônio Vieira



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